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1 Love Is Blind S8: Pods & Sober High Thoughts with Courtney Revolution & Meg 1:06:00
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Happy Valentine’s Day! You know what that means: We have a brand new season of Love Is Blind to devour. Courtney Revolution (The Circle) joins host Chris Burns to delight in all of the pod romances and love triangles. Plus, Meg joins the podcast to debrief the Madison-Mason-Meg love triangle. Leave us a voice message at www.speakpipe.com/WeHaveTheReceipts Text us at (929) 487-3621 DM Chris @FatCarrieBradshaw on Instagram Follow We Have The Receipts wherever you listen, so you never miss an episode. Listen to more from Netflix Podcasts.…
Artes
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Um dia por semana, em média, veja aqui os nossos destaques no mundo da cultura e das artes. Excepcionalmente, em função da actualidade, esta rubrica pode ter vários destaques.
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×A 1ª edição da Bienal de Arte e Cultura da Guiné-Bissau - Bienal MoAC Biss - vai decorrer de 1 a 31 de Maio, em vários espaços da capital guineense, e pretende colocar o país e os seus artistas no panorama mundial da arte contemporânea. Neste programa, falámos com o secretário da Bienal, Mamadu Alimo Djaló, e dois dos curadores do evento, Welket Bungué e António Spencer Embaló. Maio vai ser o mês da cultura em Bissau. A 1ª edição da Bienal de Arte e Cultura da Guiné-Bissau - Bienal MoAC Biss - decorre de 1 a 31 de Maio, em vários espaços da capital guineense. Mamadu Alimo Djaló, secretário da Bienal, promete que “ será um evento nunca visto na Guiné-Bissau ” para que “ a partir da cultura se dê vida à arte que se faz ” no país. Esta bienal é um evento que vai acontecer em Bissau, em vários cantos da cidade – centros culturais, jardins públicos e também espaços abertos. Nesses espaços vão acontecer actividades ligadas à arte e à cultura na Guiné-Bissau e também demonstradas a partir dos guineenses na diáspoora, mas também vai acontecer com artistas internacionais que virão à Guiné-Bissau fazer intercâmbio com artistas nacionais. É um evento que durará um mês inteiro, de 1 a 31 de Maio, será um evento nunca antes visto na Guiné e que vai catapultar aquilo que se vive em termos artísticos e culturais na Guiné-Bissau. O tema deste ano é “ Mandjuandadi: Identidades em Liberdade ”, a partir do conceito de “ mandjuandadi ”, uma tradição guineense, liderada por mulheres, de rodas comunitárias com cantos e partilha de histórias. No fundo, uma das formas mais populares de afirmação identitária guineense. Na agenda da Bienal MoAC Biss , há concertos, espectáculos de teatro, mostra de cinema, exposições de artes plásticas e visuais, workshops e palestras. A programação está dividida em cinco curadorias: artes plásticas e visuais, literatura, música, conferências e políticas públicas, assim como artes performativas e imagens em movimento. O actor e realizador Welket Bungué, curador para as artes performativas e imagens em movimento, falou-nos sobre a programação no cinema e no teatro, articulada em torno do tema da bienal. O nosso tema é a Mandjuandadi. Estamos a trazer espectáculos de teatro e performances que visam revisitar e celebrar, empoderando, a importância das histórias que têm o continente africano e especificamente a Guiné-Bissau e a sua multiculturalidade como ponto focal, como algo que precisa ser revisitado, reestruturado e celebrado nas suas múltiplas dimensões (…) No cinema, temos 10 filmes seleccionados, algumas produções inéditas e outras premiadas. Vamos dar foco a filmes que tragam visões mais arrojadas, optimistas e reinventivas quanto às visões e possibilidades de convivência e de projeção do futuro do continente africano, sejam elas produzidas por artistas residentes no continente africano ou que venham da diáspora. Além de ser uma mostra do que fazem os artistas guineenses, a Bienal quer promover a produção e criação artística, gerar intercâmbios, iniciar o processo para que a língua guineense, o Kriol, aceda ao estatuto de património cultural nacional e lançar as sementes para um museu de arte moderna e contemporânea na Guiné-Bissau. Por isso, o evento vai ter conferências sobre temas definidos como “ estruturantes ” para o sector, detalhou-nos António Spencer Embaló, curador para as conferências e políticas públicas. Oiça o programa e as entrevistas nesta edição.…
O Presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou um plano de renovação do Louvre, o museu mais visitado do mundo. A instituição deverá ter uma nova entrada e a obra mais procurada, a Mona Lisa, com 20.000 visitantes diários, deverá passar a ter “um espaço particular”, provavelmente com um bilhete à parte. Neste programa ARTES, falámos com a historiadora de arte Andréa Rodrigues sobre os planos para o Louvre. RFI: O que representa o Museu do Louvre para França? Andréa Rodrigues, Historiadora de Arte: O Louvre tem uma importância muito grande porque o Louvre é "o museu da França". Antes de ser museu, foi uma fortaleza construída por Philippe Auguste na época medieval, no século XII. Foi transformado em residência de reis, no século XIV, por Carlos V, e, durante muitos séculos, esse lugar foi realmente marcado pela monarquia francesa e por esses grandes reis coleccionadores. O Louvre quando foi transformado em museu, foi crescendo, a colecção foi aumentando e hoje é um centro internacional mundial de arte. O objectivo do Louvre não é só mostrar as obras que estão ali, é também ensinar porque é um local de ensino, as pessoas vêm com esse objectivo de aprender, de ganhar conhecimento sobre história da arte. Eu considero que é um local de importância realmente mundial ao nível de arte, por toda a história que tem e toda a colecção que ele conserva. É também o museu mais visitado do mundo. Economicamente tem um peso muito grande para França? Com certeza. Economicamente tem um peso muito grande. O Louvre é frequentado por pouco mais de oito milhões de visitantes por ano. O público estrangeiro é o número maior, se não me engano, mais ou menos 60 a 70% é público estrangeiro de fora da União Europeia, são os americanos - antes eram os chineses, mas agora são os americanos que estão em número mais importante. Depois, há uma percentagem de público francês. Então, a nível financeiro tem muitos ganhos ligados a este museu. Nos anúncios de renovação do Louvre, que foram feitos pelo Presidente francês, ele falou na possibilidade de aumentar o número de visitantes para 12 milhões por ano. O que acha deste aumento? É exequível? Este anúncio do Presidente, essa “Nouvelle Renaissance du Louvre”, com uma nova entrada, vai trazer realmente um fluxo maior. Porém, sim, hoje o Louvre, o percurso clássico com as obras-primas clássicas que todo o mundo quer ver, é um percurso bem difícil, que tem muita gente. Com este novo projecto e esta nova entrada que será feita, o objectivo é aumentar o fluxo, mas facilitar também a circulação desse fluxo no interior do museu. Então, com certeza vai aumentar, mas eu acredito que terá um fluxo muito melhor distribuído dentro do museu. O que pensa da hipótese de colocar a Mona Lisa , de Leonardo da Vinci, que é a obra mais procurada do museu, numa “sala particular”? Eu concordo e gosto porque infelizmente tem muita gente que vem só para ver a Mona Lisa. Eu já tive grupos, na alta estação turística que tem muita gente mesmo, que me pediram para os levar à Mona Lisa. Muita gente vem com esse objectivo de ver essa obra-prima, que é a mais famosa do mundo e a mais famosa do museu. Então, uma sala específica para ela, com todo um recurso pedagógico para facilitar a compreensão também dessa obra, eu acredito que é uma ideia boa. Estou já aguardando e ansiosa para poder fazer essa nova visita do Louvre e poder entrar na “Sala dos Estados” e conseguir mostrar um Ticiano que também está ali, ou um Paolo Veronese que está ali diante da Mona Lisa e que a gente, às vezes, nem consegue explicar por causa de tanta gente que tem. Eu acho que é uma boa opção. Essas obras maiores são esquecidas perante a Mona Lisa? Sim, sim. A “Sala dos Estados” tem uma riqueza enorme de obras do Renascimento, pintores venezianos que, muitas vezes, as pessoas nem olham. Elas vão ali e é só um mar de telefones, tirando fotos da Mona Lisa. Às vezes nem a Mona Lisa elas olham direito, porque é tanta gente que não tem como passar tempo admirando essa obra. E há obras que, infelizmente, passam… Outrora, o Louvre foi considerado como um “templo da arte”. Quando se vai, por exemplo, à sala onde está a Mona Lisa, o Veronese e o Ticiano, ainda podemos olhar para essa parte sacralizada da arte ou é mais uma experiência de turismo de massa? Infelizmente, às vezes, naquela sala, a gente tem um pouco essa impressão de turismo de massa. Mas a nossa responsabilidade enquanto conferencistas, enquanto guias que trabalham com esse público ali, é tentar mostrar para essas pessoas que não há só essa obra, que elas têm que tentar separar um tempo para ver as outras, para tentar tirar esse lado de turismo de massa naquela sala. Nós temos esse papel, eu tenho esse papel. Para toda esta renovação do Louvre, vai ser preciso financiamento. Uma das formas para esse financiamento é a hipótese de bilhetes mais caros para os visitantes que vêm de fora da União Europeia. O que pensa desta medida? É um pouco complicado, realmente. O facto de pagar um bilhete à parte para a Mona Lisa, eu até concordo. Agora, aumentar o custo para os estrangeiros eu acho meio complicado, eu não concordo muito. Claro que vai ser preciso dinheiro para as obras, mas tem muitos mecenas também envolvidos, tem o Louvre Abu Dhabi. Eu acho meio delicado aumentar só para os estrangeiros. A directora do Louvre tinha alertado a ministra da Cultura para problemas no museu. Sente que há problemas de congestionamento, de salas desadequadas, em termos de temperatura, para a conservação das obras, por exemplo? Na verdade, sente-se um pouco. Dentro do próprio museu, como tem um fluxo que está muito dirigido no percurso das obras mais clássicas, a gente vê que tem muitas partes do Louvre que quase não têm fluxo de pessoas e durante a semana há muitas salas que ficam fechadas. Segundo eles, é porque não tem a quantidade correcta de pessoas para trabalhar e para cuidar dessas salas. Então, é meio complicado, sente-se um pouco alguns problemas, até um pouco de stress entre os funcionários. Eu queria agora que falássemos de uma exposição que termina esta semana, "Figures de Fou – Du Moyen Âge aux Romantiques" . Houve uma grande evolução na história da arte relativamente a esta "figura"... Sim. Esta exposição, "Figures du Fou" ["As figuras do louco da Idade Média até ao Romantismo"], tem como objectivo mostrar como essa personagem de “o louco” foi representada no decorrer desses diferentes momentos da história da arte. As pessoas não podem imaginar vir visitar essa exposição pensando que vão encontrar uma história da loucura enquanto doença psicológica ou psiquiátrica. Não, não é isso. Na verdade, “o louco” teve vários significados ao longo da história. Havia, por exemplo, “o louco” que era aquele que não acreditava em Deus. Na época da Idade Média, essa pessoa era colocada de lado, à margem da sociedade, era aquele que não tem o senso do mundo e da verdade de Deus, porque a Idade Média é Deus, no período medieval tudo é Igreja e Deus. Depois, houve “o louco” no sentido daquele que deixa tudo na vida para seguir Deus, abandona a riqueza, tudo, como São Francisco de Assis. Há, ainda, o bobo da corte, aquele que vai divertir a corte, o rei, a família real e assim por diante. Depois, há o carnaval, por exemplo, onde as pessoas se fantasiam e esse também era um tipo de louco, de bobo também... A exposição também denuncia "o louco de amor"... O “louco de amor” porque o amor, em si, já era considerado desde a Idade Média como uma loucura porque a pessoa faz loucuras quando está apaixonada. A exposição termina com a questão da loucura enquanto doença que os artistas vão representar, incluindo artistas com problemas psiquiátricos. Então, é uma exposição que traz várias leituras do louco, do bobo. É uma exposição que vale a pena visitar realmente. Qual é a obra-chave para a leitura desta exposição? Há mais de 300 obras expostas, mas há alguma que, para si, melhor represente a exposição? Bom, a exposição abre com uma escultura que vem de uma igreja de Bois-le-Duc e essa escultura é interessante porque desde a Idade Média essa personagem de “o louco” é colocada à margem porque essa escultura está representada na parte externa de uma igreja, no arcobotante da igreja, representando esse louco. Gostei bastante da parte de "o louco de amor" que tem, por exemplo, uma caixinha de marfim, decorada de todos os lados com cenas ligadas a essa questão. Temos aquela história de Aristóteles que se apaixona por Phyllis, amante de Alexandre, o Grande, e faz de tudo para ela deixar Alexandre e ficar com ele. Até esse filósofo, esse homem com o pensamento bem no lugar, pode sucumbir ao amor. Como é que esta figura de “o louco” acabou por ser instrumentalizada e usada como propaganda quer pela Igreja, quer pela monarquia? Sim, é verdade. A gente vê logo ali, na primeira sala, onde tem vários manuscritos religiosos. Esses manuscritos, essas Bíblias, esses livros da época, esses livros de oração vão ser realizados com a figura dessa pessoa que recusa Deus, alguém que é marginalizado, que é representado nu, como um mendigo, como aquele que é jogado de escanteio nos vilarejos e nas cidades da época. São figuras marginalizadas, xingadas, discriminadas e isso é realmente divulgado e os manuscritos são enriquecidos com essas figuras. Mesmo na questão do bobo da corte, essas figuras estão ali só para divertir… Isso também incita a população a seguir sempre o caminho ditado pela sociedade e a não ir para as margens. Não é uma forma de controlar as pessoas? É isso mesmo, é uma forma de controlar, porque tem que se seguir o que é posto como regra, porque senão você está à margem. Então, realmente o controlo existe e vai continuar no decorrer dos séculos, mesmo depois da Idade Média. Também há uns símbolos muito curiosos, grotescos, que surgem nas obras de Bosch, que são os ovos e a galinha. Qual é a simbologia destes elementos? Nós temos várias etapas da figura do louco, da Idade Média até ao Renascimento e ao Romantismo, e chega um momento em que a figura do louco, do bobo, está tão difundida, tão espalhada, que se vê em todo o lugar. Os artistas começam a representar como se o louco aparecesse nas árvores, em vez de frutos e de folhas; as galinhas vão botar ovos e vai sair louco daquele ovo. Vai-se espalhar tanto esse personagem no espaço urbano que ele vai brotar de todo o lugar. Ele vai nascer de todo o lugar, inclusive do ovo da galinha e assim por diante.…
As obras do artista-plástico Mambo'o D27, originário de Angola e República Democrática do Congo, têm como ponto comum um objecto: um cabaz de plástico colorido, muito comum em Africa. Por detrás deste objecto estão as histórias de migrantes que, como ele, atravessaram continentes para chegar à Europa. Uma viagem cujo destino final raras vezes se confirma ser o tão esperado eldorado. Mambo'o D27: nome artístico; Neves Zola Sebastião: identidade civil. Nasceu em Luanda e estudou nas Belas Artes de Kinshasa. Chegou a França em 2018 e não tem sido sempre fácil. Paris, a França e a Europa não são o tipo de eldorado que imaginou ser. A imagem "vendida" pelos outros, pelas redes sociais, pela televisão, não é real. Depois de cinco anos a trabalhar com o Atelier dos Artistas no Exílio, um episódio conturbado, encontra-se actualmente em residência artística no Shakirail, um espaço cultural e associativo situado no norte de Paris. Foi aí que a RFI o conheceu e é lá, com vista para os caminhos de ferro que partem para norte e sul do país, que Mambo'o D27 cria as suas obras, preocupado em incentivar a reflexão sobre as representações mentais que temos das migrações.…
A
Artes
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A Casa da Cultura da Guiné-Bissau organizou um tributo à figura de Titina Silá, heroína nacional e companheira de luta de Amílcar Cabral, através de uma exposição patente em Lisboa até 2 de Fevereiro, na Casa do Comum. Intitulada "Titinas em artes", a exposição procura debater o papel social e histórico da produção artística das mulheres guineenses. Os tons oscilam entre o amarelo e o prateado. A tela é de pintura abstrata. Ao lado, a artista plástica Edna Évora, com o curador Nú Barreto . Juntos, vão acolhendo os primeiros convidados. O evento, organizado pela Casa da Cultura da Guiné-Bissau , reuniu uma centena de pessoas com a presença metafórica de uma personalidade, a heroína nacional e combatente pela independência Titina Silá, e uma questão subjacente: o que é a identidade guineense? Uma pergunta à qual a artista Edna Evora responde com a noção de diversidade e do legado dos antepassados. "A identidade guineense somos todos nós. Temos que saber viver juntos na nossa diversidade. Quando eu me exprimo através da minha pintura, que é abstracta... Escrevo de uma certa forma. Pode ser de uma maneira diferente, mas talvez esteja a dizer a mesma coisa que outro artista, que um outro pintor que faz hiper-realismo, ou outra artista que faz escultura. A ideia é ousar a liberdade, porque alguém, atrás de nós, lutou por essa liberdade. É o legado de toda uma geração... Graças a quem temos, hoje, a liberdade de poder exprimir a nossa cultura. Então, de uma certa forma, Titina Silá e todas as outras estão de uma certa forma inseridas no nosso trabalho. Elas é que nos ajudam a pegar no pincel e a ir à frente." Afinal, quem era Titina Silá ? Nascida em 1943 em Cadique, na região de Tombali, na Guiné-Bissau, Titina Silá assistiu ao massacre dos estivadores do porto de Pidjiguiti que exigiam melhores condições de trabalho e foram assassinados pela repressão do exército colonial. Titina Silá formou-se na União Soviética, onde realizou um estágio político e uma formação em socorrismo. De regresso à Guiné-Bissau, tornou-se líder na luta contra as forças coloniais, sendo que dirigiu, de acordo com fontes diversas, um comando de mais de mil homens, lutadores pela independência da Guiné-Bissau e de Cabo Verde. Titina Silá acabou por ser assassinada em 1973 numa emboscada do exército colonial português, quando atravessava o Rio Farim para se dirigir ao funeral do amigo e companheiro Amílcar Cabral, morto dez dias antes. Desde 2003, a data da morte de Titina Silá (30 de Janeiro) é celebrada na Guiné-Bissau como o Dia Nacional das Mulheres guineenses . O tributo prestado a Titina Silá através desta exposição insere-se no âmbito das celebrações do centenário do seu camarada de luta, Amílcar Cabral. O curador da exposição e também artista-plástico Nú Barreto debruça-se sobre o trabalho das outras duas artistas da exposição, Cunca na escultura e Thayra Correia no design. Ambas convidadas tanto pelo seu talento, como pela coragem de estarem na vanguarda da arte que realizam. " Enquanto curador da exposição, tive a ousadia de juntar as gerações mais novas com trabalhos completamente opostos. Uma faz pintura, outra é designer, outra faz esculturas ", começa Nú Barreto. "São profissões que, na Guiné-Bissau, não se vêem muito. Pegando no trabalho da Edna, por exemplo, é um trabalho completamente oposto daquilo que se faz, com um pendor muito virado para o simbolismo, no oposto do nosso hiper-realismo. Gosto muito dessa questão da ambivalência na oposição. Porque abre a liberdade expressiva, abre um outro caminho, mostrando que é possível ser diferente de si mesmo. Estamos a construir algo juntos, mas podemos ter liberdades diferentes. Isso é o que eu gosto no trabalho dessas três artistas." Combatentes nas artes como Titina Sila na luta pela independência, estas três artistas guineenses, cada uma à sua maneira também, cada uma com a sua arte, produzem significados e passam mensagens. Para Edna Evora, o importante é que a arta consiga "apaziguar", criar pontes, construir casas comuns mesmo que com linguagens diferentes. " Quaisquer que sejam as divergências, temos que ter a inteligência de funcionar juntos. Se têm apetência para a arte: usem, façam, mostrem. Não fiquem escondidos. Podemos dizer muita coisa com a arte, temos que ousar. " E, como diz Nú Barreto, " a arte é política... e a política é arte ". Por falar em política, foi possível cruzar-se com o presidente do Parlamento guineense Domingos Simões Pereira, entre um quadro de pintura abstrata e uma escultura hiper-realista. O líder político tece pontes entre política e arte, sendo esta última parte integrante, a seu ver, do processo de independência. "Como [Amílcar] Cabral dizia, a própria luta de libertação nacional é um acto de cultura. Porque só um povo cioso da sua identidade, cioso do seu desenvolvimento, assume o propósito da sua libertação. Tendo um líder com esta visão da importância da cultura, e tendo Lisboa como uma capital que abriga um número bastante importante da diáspora guineense, eu penso que conjugam muito bem para que a Guiné-Bissau não continue a fazer títulos só pelos piores motivos, mas que seja capaz de exibir obras de gente da cultura, de gente que pensa a nossa identidade e nos projecta de forma positiva. Enche-nos de orgulho." A exposição Titinas em Artes, patente até dia 2 de fevereiro, enquadra-se nas celebrações do primeiro aniversário da Casa da Cultura da Guiné-Bissau, em Lisboa.…
A banda desenhada “Uma História Popular do Futebol”, de Mickaël Correia, Jean-Christophe Deveney e Lelio Bonaccorso, retrata as lutas operárias, anticoloniais, feministas e revolucionárias que também marcaram o desporto-rei. Afinal, “a história do passe é também uma história política”, o “drible” nasceu para fintar a violência racista e o Campeonato Africano das Nações foi “um laboratório do pan-africanismo”, contou-nos Mickaël Correia. A BD, que mostra o futebol como “uma arma de emancipação”, é lançada a 22 de Janeiro, em França. Eis uma história diferente do desporto-rei, da Idade Média até aos dias de hoje, uma narrativa mais subversiva, em que a bola se se joga no campo social e político. Aqui, o futebol vive ao ritmo de lutas contestatárias, é terreno de resistências e de emancipação, dá voz a operários de bairros pobres, a movimentos anticoloniais, feministas e revolucionários. Esta é uma outra história do futebol, distante dos brilhos das bolas de ouro, das transferências milionárias e dos contratos chorudos de publicidade. Afinal, o futebol foi e pode ser “uma arma de emancipação”, conta-nos Mickaël Correia a propósito da banda desenhada " Une Histoire Populaire du Football ", que é publicada a 22 de Janeiro, em França, a partir do livro com o mesmo título que ele publicou em 2018, em França, e que foi editado em Portugal em 2020. RFI: Como é que esta banda desenhada apresenta o futebol? Mickaël Correia, autor de “ Uma História Popular do Futebol”: “ O tema desta banda desenhada é que o futebol não é só uma indústria capitalista, não é só o Mundial, não é só o Cristiano Ronaldo. É igualmente uma arma de emancipação para os povos colonizados, para os operários, para as mulheres igualmente. Há também uma história social do futebol que é igualmente uma cultura popular.” Como é que o futebol foi - e aparentemente é - essa tal ferramenta de contestação e de emancipação? “Há muitas coisas a dizer sobre isso, mas talvez a primeira coisa que possamos dizer é que o início da história do futebol é uma história operária. O futebol nasceu nas comunidades operárias de Inglaterra. Quando havia muitos operários, era uma maneira para eles de fazerem comunidade porque eram pessoas que fugiram das pequenas aldeias da Inglaterra para trabalhar nas grandes fábricas das grandes cidades operárias e industriais de Inglaterra e necessitavam de fazer comunidade. Haver um clube de futebol de bairro e apoiar os jogadores das suas fábricas era uma maneira de fazer essa comunidade. Podemos dizer igualmente que a história do passe tem uma história mesmo política. São os operários que começaram a passar a bola entre eles e era sinónimo de cooperação nas fábricas e solidariedade operária. Passar a bola era sinónimo desta solidariedade." No século XIX? "No século XIX, sim. Como desporto moderno, o futebol foi criado em 1873, no final do século XIX.” Confere ao futebol essa capacidade de emancipar determinados grupos, nomeadamente as mulheres. Fala no caso das “ munitionettes ”, as mulheres chamadas para trabalhar nas fábricas de armamento durante a Primeira Guerra Mundial, quando os homens estavam na frente de batalha. Como é que elas foram pioneiras no futebol feminino e como é que depois acabaram por ser banidas pelos homens? “É uma história mesmo incrível e foi a história mais difícil de investigar porque não havia muita documentação. Durante a Primeira Guerra Mundial, todos os homens foram para a guerra e nas fábricas havia mulheres que estavam a trabalhar. O patronato foi dizer às mulheres:‘O que é que vocês querem fazer depois do trabalho?’ E elas disseram: ‘Os nossos pais, os nossos primos, os nossos irmãos já estão a jogar futebol e nós queremos igualmente fazer partidas de futebol’. A partir de 1917, houve um campeonato destas ‘munitionettes’ que foi mesmo muito popular na Inglaterra e houve mesmo 50.000 pessoas num estádio em Liverpool para apoiar estas mulheres. O problema foi quando os homens voltaram para as fábricas depois do fim da guerra. Eles disseram: ‘Bom, isto foi uma brincadeira e agora vocês têm que ir para casa fazer bebés’ porque houve grande problemas de natalidade depois da guerra. Consideraram que o papel da mulher não era trabalhar nas fábricas, era fazer bebés para repovoar o país. Estas mulheres disseram: ‘Não, não é possível, queremos continuar a praticar o futebol’ e até mais ou menos 1920, 1921, elas continuaram o futebol, mas depois a Federação de Futebol Inglesa fez uma proibição porque estava com medo. Eles estavam mesmo com medo.” Medo de quê? “Medo porque ver uma mulher de calções era tabu, ver as pernas de uma rapariga. Para eles, era inadmissível ver estas raparigas a jogarem assim. Foi mesmo um grande pânico moral. Então, eles proibiram o futebol feminino em 1921. As mulheres tiveram que esperar 50 anos para poder outra vez jogar futebol em Inglaterra e até no resto da Europa.” A BD apresenta as lutas das jogadoras no campo da guerra contra o sexismo e também contra a homofobia. Como é que o futebol feminino sobrevive ainda hoje? Como é que se bate contra o patriarcado desportivo? Quando é que as mulheres mostraram, ou será que ainda não mostraram, um cartão vermelho ao patriarcado no sector? “Claro que hoje ainda há muitas lutas no futebol feminino porque ainda há grandes diferenças de salário, por exemplo, com uma grande estrela do futebol, como a Megan Rapinoe, que é campeã do mundo de futebol nos Estados Unidos. A equipa dos Estados Unidos até fez uma greve no fim dos anos 2020 para reclamar os mesmos salários que os homens. Para trabalho igual, salário igual. Vimos igualmente esta história de sexismo e de agressão sexual com a equipa feminina de Espanha, em que o presidente da Federação deu um beijo a uma das jogadoras de Espanha. Isto foi igualmente uma grande luta para elas. Neste campo do salário, neste campo da luta contra o sexismo e contra as violências sexuais, podemos ver que o futebol feminino é igualmente uma arma contra o sexismo e contra estas violências.” O livro também confere ao futebol a capacidade de engendrar revoluções. Eu queria saber qual foi o papel dos Ashlawys, os adeptos do clube egípcio Al Ahly, na ocupação da Praça Tahrir e na Primavera Árabe? “Houve um papel muito importante dos adeptos de futebol na Primavera Árabe. Na banda desenhada, falo do que se passou no Egipto, mas houve igualmente o mesmo na Tunísia e na Turquia. Houve - ainda há agora - muitas organizações de adeptos que têm uma cultura do anonimato e da autogestão, que faz com que a polícia política das ditaduras não se possa infiltrar porque são grupos auto-geridos. Eles podiam organizar-se e fazer canções ou manifestações contra o governo logo nos anos 2010, 2011. Quando houve a revolução no Egipto, já há alguns anos que os grupos de adeptos estavam a manifestar, no estádio, contra o governo, a cantar canções mesmo poderosas de crítica à ditadura. E já tínhamos igualmente algumas práticas de luta contra a repressão da polícia. Na Praça Tahrir, no Egipto, eles ajudaram o movimento revolucionário a incutir estas práticas de luta contra a polícia e de luta no anonimato.” Mas foram reprimidos… “Claro, houve uma repressão mesmo terrível no Egipto e muitas pessoas destes grupos despareciam, foram para a prisão e alguns foram mortos.” Vocês contam mesmo um episódio, falam do massacre de Port Saïd… “O massacre de Port Saïd foi em 2012. Foi uma vingança de uma batalha que houve em 2011, um ano antes, em que os adeptos de futebol ganharam uma batalha na Praça Tahrir contra a repressão da polícia. Um ano depois, a polícia organizou este massacre. Na partida entre o Cairo e Port Saïd, a polícia autorizou os adeptos do Port Saïd a entrarem com facas e, no final da partida, a polícia fechou o estádio e houve um massacre. Os adeptos do Port Saïd sacaram as facas e as armas e mataram dezenas de adeptos deste grupo que são os adeptos da equipa do Cairo. Isto foi mesmo uma vingança da vitória dos adeptos sobre a polícia em 2011.” Falam também da lição "decolonial" e de “drible social” que os brasileiros Pelé e Garrincha deram ao mundo. Quer contar-nos? “O futebol é uma religião no Brasil. Tem igualmente uma dimensão decolonial para mim. A própria história do drible é, para mim, uma história decolonial. O drible nasceu no Brasil nos anos 1920, mais ou menos, e foi um jogador negro que era sempre atacado pelos jogadores brasileiros brancos - porque neste período era proibido aos jogadores negros jogarem futebol. Arthur Friedenreich, de pai alemão e mãe brasileira, começou a meter pó de arroz sobre a sua pele para parecer mais branco. Mas no campo de futebol tinha sempre muitos ataques dos jogadores brancos porque era um período mesmo muito racista. Uma vez, Arthur Friedenreich, quando ia atravessar a rua, um carro ia atropelá-lo, ele desviou-se e fez um movimento de anca. Foi assim que o drible nasceu. Ele mesmo disse: ‘Como não posso lutar contra a violência dos brancos no campo, a melhor maneira de lutar contra a violência é desviar a violência. Então isto é mesmo uma coisa de uma luta decolonial. Quer dizer, não posso fazer nada contra as pessoas que têm este monopólio desta violência do Estado, então a melhor maneira é desviá-la. O Pelé e o Garrincha fizeram-no de uma maneira artística. Foi mesmo arte.” Na BD, chamam-lhe “o jogo bonito”. “Sim, jogo bonito ou “Futebol Arte” é outro termo que se usa no Brasil que é fazer desta arte uma identidade afro-brasileira, com este desvio da anca que tem esta história de como lutar contra esta violência do colonizador.” Outra noção na BD é justamente o futebol como um campo de resistências. Como é que o futebolista austríaco Matthias Sindelar, conhecido como “o Mozart do futebol”, se tornou num símbolo de resistência face ao regime nazi? “O Matthias Sindelar, em 1938, era mais ou menos o Cristiano Ronaldo deste período. Em 1938, a Alemanha invadiu a Áustria e quis fazer uma grande cena de propaganda nazi com um jogo entre a Áustria e a Alemanha nazi. A propaganda era dizer que o povo da Áustria e o povo alemão eram o mesmo povo e que apoiavam o III Reich e o seu líder Adolf Hitler. Antes da partida, os diferentes chefes nazis foram ver o Matthias Sindelar para lhe dizer ‘vamos fazer um jogo de propaganda e tem que acabar com um zero zero’. O problema é que quando a partida começou, a equipa da Alemanha jogava mesmo muito mal e a Áustria, que era uma das melhores equipas da Europa, teve que fingir não jogar bem. O problema é que no final da partida, Sindelar já não podia fingir jogar mal e marcou um golo. No final da partida, toda a gente estava a dizer que o Sindelar ia ser morto, enviado para um campo de concentração ou algo assim. Como Sindelar era tão famoso, era uma celebridade desta época, os nazis não o quiseram matar. Durante mais ou menos um ano ou dois, ele entrou na clandestinidade porque era contra o regime nazi e a mulher dele era judia. Foram encontrados mortos no seu apartamento, em 1939, e ninguém sabe o que se passou. Ninguém sabe se foi a Gestapo que assassinou o Matthias Sindelar. O que sabemos é que quando ele morreu, houve nas ruas de Viena mais ou menos 15.000 pessoas e, neste período, todas as manifestações públicas eram interditas pelo regime nazi, o que foi visto, na época, como a primeira resistência civil da Áustria contra o regime de Adolf Hitler.” Outra história muito comovente, ainda na parte das resistências, é a dos irmãos Starostine. Quer resumir-nos a história destes irmãos e como é que, graças ao futebol, eles sobreviveram ao Gulag? “Há uma equipa muito famosa que se chama o Spartak Moscovo, que é a grande equipa popular da capital da Rússia. Nos anos 30, 40, quando o regime de Estaline era muito poderoso e muito repressivo sobre a população, a maneira de dizer não do povo de Moscovo era não apoiar a equipa do partido que era o Dínamo de Moscovo, a equipa oficial da polícia política, mas antes apoiar o Spartak Moscovo, que era a equipa do povo e pertencia a dois irmãos que se chamavam os irmãos Starostine. Estes irmãos eram mesmo muito populares junto da população operária da Rússia. O problema é que a polícia política não gostava que estes irmãos fossem muito populares e que uma grande parte da população russa não apoiasse a equipa da polícia política. Então, em 1940, enviou os dois irmãos para o campo de trabalho, o Gulag. Quando os irmãos chegaram ao Gulag, todos os presos tiveram uma grande solidariedade com os irmãos Starostine, o que fez com que eles sobrevivessem durante quase cinco anos.” A BD aponta ainda o futebol como um terreno de contestação anticolonialista. Contam que na colonização em África, por exemplo, o futebol começou por ser visto como uma forma de dominar o corpo da pessoa colonizada. Quando é que isso muda? “Isso muda depois da Segunda Guerra Mundial. Antes foi a Igreja e os diferentes E stados colonizadores que usaram o futebol para dominar o corpo do colonizado, era mesmo para prender, para domesticar o corpo da pessoa colonizada. Durante a guerra, nas tropas de libertação da França, igualmente por toda a Europa, havia muitas pessoas da Guiné, dos Camarões ou do Senegal e a França para lhes agradecer deu-lhes liberdade de associação. A partir de 1946, 47, 48, houve uma explosão dos clubes de futebol organizados por estes povos colonizados. Estes clubes autogeridos pelos colonizados foram lugares para falar de política e se se podia gerir clubes de futebol e campeonatos de futebol, podia-se igualmente gerir o país. Então, os clubes de futebol, autogeridos pela colonizados, foram um laboratório político, um laboratório de auto-gestão e político. Houve muitos líderes da independência na Argélia, no Senegal ou na Nigéria que foram presidentes de clubes de futebol nesses países.” O próprio nascimento do Campeonato Africano das Nações acaba por ser um instrumento do pan-africanismo, não é? “Sim, claro. A primeira Taça de África das Nações foi igualmente um laboratório do pan-africanismo. Foi uma maneira de dizer à Federação Internacional de Futebol: ‘Podemos organizar a nossa própria taça de futebol no nosso continente’. E foi uma forma igualmente de propaganda para dizer que o continente africano tem de ficar unido na política e o futebol era mesmo uma boa maneira de mostrar esta unidade no mundo inteiro.” Nesta “História Popular do Futebol”, não fala directamente de uma das maiores estrelas de futebol contemporâneas, o Cristiano Ronaldo, a não ser em alguns desenhos e algumas falas indirectas. Porquê? “O Cristiano Ronaldo é desenhado no princípio da banda desenhada, mas é mais para mostrar que esse jogador é um grande símbolo da indústria capitalista que é hoje o futebol. É uma pessoa muito conhecida,é uma pessoa que representa Portugal, mas é igualmente uma pessoa que representa o melhor da indústria do capitalismo futebolístico hoje.” Que é o contrário da mensagem que transmite o livro… “Sim, é o contrário da mensagem. A mensagem do livro é dizer que, claro, o futebol é uma indústria, mas dentro desta indústria podemos ver algumas práticas de resistentes. Como estamos em França, para muitos lusodescendentes, para muitas pessoas que vêm da emigração portuguesa, o Cristiano Ronaldo é uma maneira de dizer ao povo francês e aos outros povos europeus que somos um povo de emigração, somos um povo trabalhador que não se ouve muito em França, mas podemos ter este orgulho de ter um jogador como o Cristiano Ronaldo. O Cristiano Ronaldo é a oposição do estereótipo do português em França porque é um jogador que se vê muito, é um jogador que tem muito orgulho. Isso vem contra este estereotipo do português que é muito invisível, que não diz nada, que só está aqui [França] para trabalhar.” Então, também o Cristiano Ronaldo se emancipou? “Isso é a contradição do futebol: pode ser uma mensagem muito capitalista, é um mercado, mas pode ter igualmente uma mensagem muito política. É isto mesmo que gosto nesta história do futebol: é uma coisa que está sempre em contradição entre um espectáculo muito capitalista, onde há muito dinheiro, mas é igualmente um desporto muito popular e onde há muitas resistências.” Em contrapartida, vocês dedicam um capítulo a Diego Maradona, que era visto como um deus. Como é que se explica a divinização deste jogador com aspectos tão controversos, nomeadamente as drogas, os excessos? “Na Argentina, este jogador é um deus porque ele vem de um bairro muito popular e aprendeu a jogar na rua. Isto é uma coisa muito importante para o povo da Argentina que se pode identificar com ele. Houve uma partida muito conhecida em 1986 contra a Inglaterra. Ele pôs a…” A “mão de Deus”… “A mão de Deus, ele marcou um golo com a sua mão. Para o povo argentino, era uma coisa tipicamente do povo argentino. Quer dizer, não podemos lutar contra os ingleses, que eram igualmente um povo colonizador, mas vamos fazer esta coisa que é mais do âmbito da cultura do malandro, da cultura de rua, em que para sobreviver tens de roubar, para ganhar contra o dominante tens de fazer batota. O que se passou quando Maradona foi para Nápoles foi a mesma coisa. O povo de Nápoles é um povo que vive muito na rua e gostou muito deste jogador. A divinização é igualmente muito importante porque na maneira de falar dos napolitanos, ‘Maronna’ quer dizer a Virgem Maria. Então Marona é muito próximo do Maradona. Há igualmente um aspecto muito crístico porque Diego Maradona tomou muita droga, o corpo dele estava, no fim da sua vida, muito gordo. Houve mesmo uma exposição do corpo dele, um pouco como o Cristo que mostrou as suas feridas e o corpo martirizado. Então, o povo argentino dizia que este jogador era mesmo uma pessoa do povo, que estava a mostrar um corpo martirizado e houve uma aproximação entre o Maradona e a sua parte mais crística.” Acaba o livro com uma personagem, mulher, no café com os amigos, a dizer que “nos relvados, nas tribunas e nas ruas, uma outra história do futebol continua a ser escrita”. Os campos de futebol ainda são um terreno de luta? “Podemos vê-lo diariamente. Nos campos de futebol, nas tribunas, vimos apoio à Palestina, por exemplo, na Escócia, e até aqui em Paris. Em Paris, houve uma grande manifestação dos adeptos a favor da Palestina. Há igualmente muitas lutas antirracistas. Estamos a ver muitos jogadores que estão a dizer que eles não são racistas. E estamos a ver igualmente alguns jogadores na luta contra a LGTBfobia. O futebol é um espelho do que se está a passar na sociedade e isso pode ver-se no campo de futebol todos os dias.” Em 2018, em França, publicou esta “História Popular do Futebol” sob a forma de um ensaio. Em 2020, editou-a em Portugal. Por que é que decidiu adaptar a obra ao formato BD? “Era para ser mais popular. O livro tem mais de 500 páginas e pode ser um bocadinho difícil para algumas pessoas que não têm o hábito de ler muito. Fazer esta adaptação para banda desenhada é uma maneira de os jovens também conhecerem esta história de resistência.”…
“Em Silêncio” é uma banda desenhada de Adeline Casier que ilustra o que foi o “salto”, ou seja, a emigração clandestina para França de milhares de portugueses durante a ditadura do Estado Novo. Entre 1957 e 1974, 900 mil portugueses foram para França e milhares atravessaram as fronteiras sem passaporte. Foi o caso do avô da autora, cuja viagem clandestina para França é retratada na obra e mostra que os dramas da imigração ilegal continuam, só mudaram as nacionalidades dos protagonistas. A história de “Em Silêncio” começa com disparos sobre homens que caminham em fila algures nas montanhas dos Pirinéus. Estamos em Novembro de 1962 e a miséria, a falta de trabalho e a ameaça de mobilização para a guerra colonial obrigam João a deixar as filhas e a esposa na aldeia de Arnozela, no norte de Portugal, para procurar sustento em França. João vai à procura de uma vida melhor e mergulha numa viagem para o desconhecido depois de pagar a um passador. A sua história ecoa com as de tantos milhares de portugueses que a viveram e com as de tantos outros que hoje a repetem a partir de outros países. “Através da história do meu avô, espero que os leitores se possam identificar com uma história mais universal que é a da imigração ilegal” , conta a autora, que nos começa por explicar o porquê do título “Em Silêncio”. Esta história é baseada no testemunho do meu avô, mas eu criei uma parte. Há uma personagem que eu inventei e que não fez parte do seu testemunho. Existem também cenas que acrescentei para fins narrativos e para o argumento. De qualquer forma, no seu testemunho, o que aparecia muito era que nesta travessia que ele fez, havia esta coisa de se esconder sempre, de não fazer barulho, como se tivéssemos de ser um pouco transparentes... Esconder-se nas granjas, nas rochas, na natureza. E tudo porque ele atravessou a Espanha a pé. E depois, ‘Em Silêncio’ porque, na minha história, o meu avô teve uma espécie de vergonha em relação ao que viveu e há toda uma reflexão em torno do facto de ter passado por tudo aquilo para chegar a um país onde não se sentia necessariamente confortável ou não foi bem-vindo como esperava. É como um sonho desfeito. Esperávamos encontrar logo um trabalho, ter dinheiro, ter uma vida confortável e acaba por ser um pouco mais complicado do que isso. Também noutros testemunhos de migrações, ouvi muito sobre o medo de contar à família tudo por que se passou, tudo o que se viveu e que quando lá se chegou, foi difícil e houve uma espécie de desilusão. Foi aos 23 anos que Adeline pediu ao avô para lhe contar o que viveu e agora, com 27, publica a BD. O objectivo não é fazer do avô um herói, mas mostrar a dimensão universal e intemporal da emigração. Desde pequena, ela sempre ouviu os relatos da mãe, de onde sobressaía a imagem do avô a entrar em França escondido numa carrinha carregada de porcos que iam para o matadouro. Esta é a história do meu avô. Pedi-lhe para me contar a sua história, como chegou a França. Tudo começou porque a minha mãe me contava uma pequena parte dessa história que é o momento em que o meu avô teve de atravessar a fronteira entre Espanha e França. Como havia o risco de controlos da alfândega, ele escondeu-se num camião de porcos com outras pessoas que emigravam. Tiveram que se esconder porque isso evitava que a alfândega revistasse os camiões e também porque conseguiam estar no quentinho porque era no inverno. Por isso, sempre tive esta história na cabeça, desde a minha infância, e quis saber mais. Então, pedi ao meu avô que me contasse a sua história e decidi fazer um livro. É preciso ver que as histórias de imigração ilegal são muito contemporâneas. Ainda que esta história conte momentos vividos que podem ser muito diferentes de alguém que hoje migre de um país africano para França, penso que se encontram imensas dificuldades para se chegar a este país e para se ser acolhido como se deve, com respeito. Há, ainda, um certo "silêncio" em torno da história da emigração portuguesa para França durante a ditadura do Estado Novo. Nos últimos anos, o tema começou a ser mais tratado em filmes, livros, estudos académicos e isso contribuiu para se começar a falar mais no seio das próprias famílias, até graças à curiosidade das gerações mais novas que procuram as raízes. Foi o que aconteceu, também, com Adeline. Antigamente, tinha-se medo de falar. Não era bem medo, eu diria que não nos atrevíamos a falar das dificuldades da vida, de quando chegávamos ao país de destino e vivíamos na pobreza ou não era o que esperávamos. Talvez tivéssemos medo do olhar dos outros, que dissessem “foi para isso que saíram do país”…. E depois há muitos portugueses que tiveram a impressão de que essas pessoas que partiram traíram o país. Bem, foi o que ouvi, não é o que penso, mas foi o que ouvi. Acho que isso também deve ter contribuído para o facto de não se querer contar esta história. Além disso, em França ouvi muito a frase ‘Ah, os portugueses são mesmo bons trabalhadores, nunca dizem nada, nunca se queixam’. Mas acho super hipócrita dizer-se isto porque mostra que os portugueses não tinham meios para falar e dizer o que sentem ou não podiam porque se o fizessem o patrão poderia dizer-lhes: "Então amanhã não venha trabalhar' e se não houver emprego, não há papéis. Isso colocava as pessoas em situações muito complexas e em que não tinham voz. Fazer este livro foi também uma forma de dar voz ao meu avô, de o homenagear e de lhe dar a voz que ele talvez não tenha tido naquela altura. Ele saiu de Portugal porque havia a ditadura salazarista e porque houve mobilizações para levar pessoas para Angola, para Moçambique. Depois, a França beneficiou bastante porque houve muitos portugueses que vieram para França sabendo que o país tinha de ser reconstruído depois da guerra e que encontrariam trabalho imediatamente. Este foi também o caso dos italianos durante um período e os patrões beneficiaram porque tinham mão-de-obra barata que podia realizar trabalhos difíceis. A história do avô e dos seus companhieros de viagem é uma longa travessia que dura noites e dias. São quilómetros e quilómetros e quilómetros a caminhar imenso a pé, a dormir ao relento e em granjas, sempre escondidos, à mercê do frio, dos passadores e da eventual solidariedade de quem cruzassem. Pelo caminho, perde-se a noção de tempo e espaço, há fome, sapatos rotos, encontros e desencontros. Os contrastes dos desenhos, a preto e branco, acentuam as paisagens interiores e exteriores que acompanham as personagens. Gosto muito de trabalhar a preto e branco. Tentei trabalhar com cor, mas não funcionava. O preto e branco e os contrastes que posso obter com o meu lápis também me permitem usar esses ambientes cinzentos como uma ferramenta para contar histórias. Na verdade, não é só dar a atmosfera de uma cena, a luz, é também a forma como conto uma história, como posso intensificar a emoção de uma personagem, por exemplo, ou destacar um elemento graficamente para reforçar algo. Na verdade, o meu preto e branco, os meus contrastes são uma ferramenta gráfica da narrativa. Como o meu avô me contou a sua história, eu quis conseguir transcrever pela narração os seus sentimentos. A certa altura, havia realmente uma noção de perda de tempo porque ele tinha constantemente de atravessar caminhos de montanhas, vales, e esconder-se… Por vezes podia ser recuperado por um passador a meio da noite ou a horas completamente aleatórias porque era perigoso e talvez fosse melhor atravessar à noite porque havia menos risco de se encontrarem pessoas ou porque os passadores só podiam chegar nessa altura - muitas vezes eram pessoas que faziam outras coisas em paralelo. O meu avô contou-me que, quando ele fez a travessia, houve pessoas que não chegaram ao fim. Há, ainda, os ecos da “ fotografia rasgada ” a recordar a forma como se pagava aos passadores e em homenagem ao trabalho do cineasta que mais retratou a emigração portuguesa em França, José Vieira . Também se vê a pobreza dos bairros de lata desenhados a partir das imagens de Gérald Bloncourt, o fotógrafo franco-haitiano que também escreveu um capítulo da história dessa emigração. Através da história do meu avô, espero que os leitores se possam identificar com uma história mais universal que é a da emigração ilegal (…) Espero que isto possa criar uma reflexão sobre as migrações e sobre a visão que temos em relação às pessoas que consideramos estrangeiras no nosso país. Bem, não tenho a certeza que a palavra ‘estrangeiro’ seja uma boa palavra porque podemos não ter exactamente as mesmas culturas, mas somos todos seres humanos que sentem coisas, que experienciam coisas e somos, um pouco, todos iguais. Há pouco mais de 50 anos, milhares de pessoas fugiam de Portugal, onde estavam privadas de tudo, incluindo das necessidades mais básicas como o pão, a saúde, a educação e a liberdade. A BD “Em Silêncio” recorda-nos que ontem eram os portugueses a atravessarem fronteiras sem documentos e que hoje são tantos outros povos a entregarem-se a passadores e a rotas desconhecidas para tentarem, simplesmente, uma vida melhor.…
Elson e Wilson Fortes, dois irmãos artistas residentes em Boston, nos Estados Unidos, realizaram o protótipo de um boneco de Amílcar Cabral, o primeiro de uma série de “bonecos revolucionários” que estão a criar e que visam inspirar as famílias a partilhar histórias sobre “heróis da vida real”. Os gémeos de 36 anos, filhos de pais cabo-verdianos, têm uma marca de roupa que também imprime nos tecidos desenhos e frases dos “heróis” que eles querem dar a conhecer um pouco mais ao público norte-americano. “Quisemos fazer um herói verdadeiro, um boneco com um significado, uma boa história” , começa por contar Elson Fortes à RFI a propósito do primeiro boneco articulado que representa Amílcar Cabral. A ideia surgiu depois de os irmãos já terem representado em peças de vestuário o pai da luta pela independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde. Por enquanto, o boneco ainda é um protótipo, mas a versão comercial poderá estar no mercado até ao final de 2025. Tudo começou no ensino secundário, em Boston, quando Elson e Wilson criaram, num trabalho de grupo, a ideia que viria a dar origem à sua marca de roupa e acessórios, a “Crazygoodz”, qye tem como slogan: “ A vida é dura, mas torna-a bonita ”. O conceito é desenhar histórias em tecido e representar líderes históricos em roupas e acessórios. Amílcar Cabral é uma das figuras que mais representam e, por isso, foi também a personalidade escolhida para criar o boneco articulado. O objectivo é criar uma colecção de “ bonecos revolucionários ”, com personalidades como Titina Sila, uma das mais conhecidas combatentes pela independência da Guiné-Bissau, Cármen Pereira, outra guerrilheira pela independência da Guiné-Bissau que foi a primeira mulher na presidência de um país africano e a única na história guineense, mas também os mais conhecidos Malcom X, Martin Luther King e Angela Davis. Mais tarde, também consideram homenagear lendas da música cabo-verdiana como Cesária Évora e Ildo Lobo. Oiça a história neste programa ARTES.…
Carisa Dias é uma artista que concentra a energia para conquistar os palcos da música. Carisa é o nome do primeiro álbum da cantora de origem cabo-verdiana, que nasceu em Portugal e cresceu no Luxemburgo. Estas circunstâncias reflectem-se no trabalho de Carisa Dias e contribuem para a riqueza e densidade que resultam da fusão de estilos e ritmos como por exemplo morna, afrobeats, bossa nova, pop ou soul. "Sintonia" foi o single de apresentação. Um tema romântico que Carisa Dias canta em Português, Crioulo e Inglês e agrega sonoridades que remetem para Fado, Morna e Kizomba. "There for you" foi o segundo tema disponibilizado ao público e mostra o envolvimento de Carisa Dias com a sociedade e o desejo de contribuir para uma mudança, pela eliminação da violência contra a mulher. A apresentação do álbum Carisa está previsto para março de 2025 em Lisboa e a RFI aproveitou a presença do produtor Mesaro e da cantora na capital portuguesa para uma entrevista. Uma conversa onde se fala de episódios ocorridos durante a gravação do disco, da preocupação em combater a violência contra as mulheres, do concerto esgotado no Luxemburgo ou da vontade de se apresentar em Cabo Verde.…
O filme Banzo, passado no início do século XX em São Tomé e Príncipe, de Margarida Cardoso estreia este mês em França. No entanto, temas como migrações forçadas, a impossibilidade do retorno e a impotência de quem não detém o poder nem a autoridade são temas cada vez mais actuais. O médico português Afonso Paiva chega em 1907 a São Tomé e Príncipe e é confrontado com uma misteriosa doença, que faz com que um grupo de contratados vindos de Moçambique deixem de comer e passem os seus dias prostrados, sem capacidade para trabalhar. Chamam-lhe a esta doença nostalgia, ou banzo. Um sentimento cunhado pelos escravos levados nos séculos precedentes de forma forçada de África para o Brasil. É assim que começa a história do filme de Margarida Cardoso, Banzo, que foi mostrado em antestreia no Festival Olá Paris!, que decorreu na capital francesa. O filme tem saída oficial em França no dia 25 de Dezembro e a ideia para esta longa-metragem tem como partida relatórios médicos que Margarida Cardoso encontrou enquanto fazia pesquisa sobre a planta de cacau no arquipélago, como descreveu em entrevista à RFI. " A ideia deste filme surgiu pelos tempos que passei em São Tomé e Príncipe para fazer um documentário que até na realidade era uma encomenda sobre a planta de cacau e eu comecei a investigar sobre a planta de cacau que veio da Amazónia e depois acabei por passar muito tempo pensando como é que era a relação que tínhamos mais próxima com essa planta e nos arquivos encontrei muitos relatórios médicos onde fiquei intrigada com uma lista que faziam das pessoas que eram internadas nos hospitais, das roças onde havia pessoas que morriam, do que se chamava nostalgia. E aquilo começou intrigar-me. E eu sabia que a nostalgia é o que se chama depressão no fundo. E tentei então fazer este filme inspirado nessa relação, porque a relação das roças também com os hospitais e com a questão de manterem a mão de obra sempre muito oleada é uma coisa que nos faz pensar sobre estes sistemas coloniais. E foi daí que nasceu essa ideia de criar o Doutor como personagem principal ", disse Margarida Cardoso. Mesmo sendo um filme de época, passado no início do século XX, Margarida Cardoso diz que a situação destes contratados forçados a deslocarem-se se assemelha muito aos actuais movimentos de migrações em que quer por razões económicas quer para fugir à guerra, muitas pessoas partem dos seus países em África, Ásia ou América do Sul para tentar uma vida melhor nas potencias ocidentais. " Tentei no filme mostrar várias imagens ou algumas analogias com o que se passa hoje. Tanto o barco onde as pessoas estão, como o sistema de 'importação' das pessoas, onde os passadores são pessoas que mudam de nome, mudam de lugar, mas são sempre os mesmos e que, no fundo, todo esse lado mais de escravatura que existe hoje e que é uma escravatura moderna e contemporânea, ela existe exactamente nos mesmos sistemas ", declarou. O filme fala também da situação de São Tomé e Príncipe há mais de 100 anos, quando ainda era uma colónia portuguesa e vivia sob o domício das grandes empresas detentoras das roças de cacau,noutra analogia com o que é hoje São Tomé e Príncipe. " Eu tenho muita consciência do que se passa em São Tomé. É uma espécie de, pelo menos no meu ponto de vista e pode ser às vezes um pouco injusto, mas é como se fosse um limbo. Está tudo parado e tudo à espera de que alguma coisa se movimente, aconteça e não está a acontecer nada. [...] Eu acho que São Tomé foi quase sempre um entreposto e uma terra que serviu para ser explorada. E hoje, já não havendo essa exploração, acabamos por ficar numa espécie de um limbo, no sítio, em lado nenhum. E eu não vejo muitas perspectivas, mas tenho a certeza que haverá solução para muitas das coisas que acontecem no país ", declarou a realizadora. Esta película foi rodada em São Tomé e Príncipe, com a equipa a deslocar-se até lá, levando com ela a logística necessária para filmar. No entanto, a chuva não deu tréguas à rodagem assim como outras peripécias, algo que acabou por unir a equipa e os habitantes locais que participaram no filme. " Eu acho que não houve nenhum dia no filme que não houvesse uma grande catástrofe, Mas é mesmo verdade e sempre conseguimos ultrapassar essa catástrofe. E isso foi muito bom. Realmente a nível técnico, fazer chuvas em São Tomé é muito difícil. Chegámos a encher piscinas porque a chuva no cinema não pode esperar, tem de ser contínua. Foi tudo muito difícil, mas a própria natureza às vezes estava contra nós. Mas no fundo, num balanço geral, acho que até esteve a favor ", concluiu. O filme tem estreia prevista em São Tomé e Príncipe para o mês de Maio.…
" Grand Tour ", que obteve o prémio de melhor realização no Festival de Cannes, em Maio passado, chega agora aos cinemas franceses. O filme é a adaptação de uma obra do romancista britânico Sommerset Maugham e relata um périplo pela Ásia de dois noivos, ele a tentar fugir dela e a noiva que vai no encalce daquele com quem se deveria casar. O realizador português, Miguel Gomes, falou com a RFI sobre o impacto do galardão, as peripécias de um filme que tem como palco uma longa viagem pela Ásia e respectivos projectos. O cineasta começa por se referir à sua surpresa com a obtenção desta prestigiosa recompensa, proeza inédita na história do cinema português no Festival de cinema de Cannes. Como é que vive esta estreia francesa após o prémio para o seu filme no Festival de Cannes ? Foi surpreendente. Eu não esperava nada. Se calhar é uma atitude defensiva da minha parte, mas à partida eu acho que estatisticamente é mais provável não haver prémios do que haver. E então segui esse princípio. Desta vez também, portanto, achei que não ia haver prémios nenhuns. Lembro-me que nesse dia fui para para uma ilha que existe a alguns quilómetros de Cannes, assim a uma meia hora de barco. Há uma ilha de monges, de que eu não me recordo o nome e fui com os meus filhos. Estava com a minha mulher, estava com as pessoas da equipa, com os actores, com os produtores e fomos todos para para essa ilha nesse dia. À espera que não acontecesse nada. E às tantas o telefone tocou e disseram nos " Onde é que vocês estão? O que é que vocês estão a fazer? Mas vocês têm que voltar. Têm que ir para a cerimónia ! Vai haver um prémio ." E havia muito pouco tempo. Aliás, estávamos meio perdidos nessa ilha. Apesar da ilha ser simples e só haver uma estrada, tínhamos decidido ir a um restaurante, mas tomámos a direcção contrária, então estávamos quase a fazer o perímetro da ilha para chegar ao restaurante e tivemos que nos despachar e apanhar o barco para estar presentes na cerimónia. E acho que isto: esta recompensa, este galardão, este prémio recompensa o quê, exactamente ? A estética do filme? Porque porventura talvez seja a matéria prima que está a mais a dar nas vistas e que evoca, obviamente, projectos já seus no passado, que tinham tido bastante incremento, nomeadamente aqui em França. Eu penso no "Tabu" há 12 anos. Eu não sei, eu não consigo separar assim as coisas desta maneira... E essa história da estética e do fundo. Eu acho que são as duas coisas. Um filme conta-se, mas sobretudo, vive-se e vive-se com a imagem, com o som. Com as coisas que o filme conta também, mas sobretudo com as coisas que o filme mostra. E tudo faz parte do mesmo sistema. E para mim não existe assim uma distinção entre aquilo que é o aspecto do filme e aquilo que é o que o filme conta, por exemplo. Faz tudo parte do mesmo sistema e, portanto, acho que a experiência do filme é um filme que tem as suas peculiaridades, tem a sua personalidade. Eu, felizmente não tenho ninguém a dizer-me que tem que fazer as coisas assim, que tenho que por este actor e que tenho que aos 30 minutos de filme tem que haver esta cena e aos 40 minutos esta outra cena. Ou seja, não tenho uma pressão da produção, não tenho uma pressão industrial que me deixe refém de uma mecânica mainstream industrial e, portanto, posso fazer aquilo que me apetece. O que pode ser algo para algumas pessoas bastante chato porque não corresponde àquilo que normalmente as pessoas associam ao cinema mais recorrente. E você pensa mais nos planos contemplativos, na duração das sequências, quando se refere a possíveis vozes detractoras do cinema que você faz? Há vozes detractoras e há... Há vozes muito elogiosas, com certeza ! Há vozes muito elogiosas ! Eu não sei se há muitos planos contemplativos... A contemplação também me aborrece um bocadinho. Ou seja, os planos têm que durar o tempo que duram para mim por uma razão precisa. E não porque estamos embasbacados perante qualquer coisa. Isso não funciona assim. Eu penso muito no lugar do espectador dos meus filmes. Para mim, o cinema é um bocadinho como fazer um edifício. Ou seja, quando se fala: qual é que é a arte que terá uma relação maior com o cinema? Há quem diga que é pintura, há quem diga que é literatura. Enfim, o teatro, a música... A música eu acho que é bastante importante, mas eu diria que é a arquitectura. Ou seja, no sentido em que inventar um filme, fabricar um filme é inventar um espaço que vai ser percorrido por alguém, um espectador. E cada espectador é diferente do outro, porque cada um vai accionar a sua sensibilidade, o seu sentido de humor, enfim, os seus interesses. E vais esperar certas coisas do filme. E, portanto, é um encontro: é um encontro entre uma pessoa, com a sua própria personalidade, e um filme que existe no ecrã e nas colunas de som da sala de cinema. E é assim que pode ser um encontro ou um desencontro. Mas o meu trabalho como realizador é inventar um espaço que vai ser percorrido por esse espectador, que não deve ser nem uma prisão. Ou seja, no sentido em que o filme não o deve coagir, de uma maneira completamente autoritária, e dizer " Agora vais para a esquerda, agora vais para a direita. Agora há que sentir isto. Agora tens que pensar isto, porque isto é como tu deves pensar ". E, por outro lado, também não deve ser um espaço completamente aleatório onde o espectador fica completamente perdido. Portanto, esse equilíbrio entre inventar uma estrutura que possa acolher alguém que será livre o suficiente para poder percorrer aquele espaço, sem estar completamente coagido, e ao mesmo tempo que não esteja ali perdido... É o nosso trabalho e que é quase um trabalho de arquitecto. Então entremos precisamente mais na obra e no seu filme. Como é que da obra do romancista britânico Sommerset Maugham se chega a este produto final? O "Grand Tour" era um ritual nalguma alta sociedade, precisamente, de fazer um grande périplo antes de assentar arraiais, de contrair matrimónio e de constituir família. E vai ser o pretexto para "um périplo e peras", pela Ásia. Como é que foi, então chegar-se aqui? Essa questão é interessante: do que o que é que era o lado quase pedagógico do Grand Tour que estava estabelecido ? O Grand Tour asiático... Havia um Grand tour europeu também. Mas havia o Grand Tour asiático. Ou seja, muita gente do Ocidente ia fazer um itinerário, no princípio do século XX, do Oeste para este.Normalmente de um ponto da Índia ou da Birmânia, que eram os pontos mais a oeste do Império Britânico, para este. Terminando normalmente no Japão e na China. E havia de facto essa ideia de que era necessário confrontar os elementos, os filhos dessa alta sociedade europeia ou americana com o outro. Ou seja, com uma cultura bastante diferente, nos antípodas. Para que, de facto, pudessem regressar mais iluminados. Neste filme esse Grand Tour é feito, mas quase com a ideia contrária. Ou seja, os personagens não fazem esse Grand Tour porque querem encontrar um caminho e um rumo. Enfim, é como diz, chegar mais bem preparados, voltar mais bem preparados para a vida. Eles estão completamente perdidos ! Há um quer fugir da noiva. O noivo, o Edward, quer fugir da noiva porque está com dúvidas sobre o casamento. Tem uma espécie de um ataque de pânico, uma crise, e decide fugir dela. E ela vai atrás dele para tentar-se casar com ele de uma forma igualmente desesperada e meio perdida. E portanto, o filme esta. Eles acabam por fazer esse caminho não como como uma fuga e não como um momento para fazer um encontro, para conhecer coisas. Eles estão basicamente em movimento para escapar ao seu destino ou para tentar concretizar aquilo que eles acreditam ser o seu destino. Mas como é que você tropeçou neste enredo e decidiu pegar nele e levá lo? Esta história dos noivos deste casal, o noivo e a noiva: um a fugir, ela a perseguir. Veio deste livro do Sommerset Maugham, que é um livro de viagens. Existe uma tradução em português chamada "Um Gentleman na Ásia". E eu estava a ler esse livro. Eu gosto muito de ler livros de viagens: de ver como é que os escritores contam a experiência de viajar e o que é que eles viram. Enfim, essa essa questão do olhar de alguém sobre um relativamente a um território que lhe é estrangeiro, que lhe é desconhecido, que que é uma coisa distante, interessa-me muito. E portanto, eu gosto de ler livros de viagens. E li este por acaso e deparei-me com esta história que o Sommerset conta. Às às tantas, em duas páginas desta história, ele diz que conheceu um senhor que trabalhava para a administração na Birmânia, inglesa, e que contou a história de como fugiu à sua noiva. Porque entrou em pânico, porque teve dúvidas sobre o casamento e sobre a responsabilidade desse casamento. E decidiu partir e deixar-lhe uma nota a explicar-se, a escusar-se com trabalho. E partiu para Singapura. Mas quando chegou a Singapura já tinha uma nota, um telegrama da sua noiva a dizer " Meu querido, eu estou a chegar. Percebo perfeitamente. Mas estou a chegar e já já nos vamos casar ." E ele lá partiu de novo. E esse, digamos, movimento que é uma espécie de um "Jogo do gato e do rato", durou vários meses e acabou por ser feito ao longo deste deste "Grand Tour", ou seja, deste itinerário todo que de muitos milhares de quilómetros. Foi um "Jogo do gato e do rato" também para si e para a sua equipa. Porque obviamente, o confinamento e o COVID veio perturbar as rodagens e a preparação do filme. Portanto, houve aqui sequências, pelo que eu entendi, nomeadamente a rodagem na China, que tiveram que ser recebidas a posteriori. Houve uma interrupção óbvia por causa do COVID Portanto, foi necessário congelar o projecto durante X tempo ?! Sim, ou seja, nós decidimos, antes de escrever o argumento, fazer nós próprios a viagem e filmá-la. Filmar a viagem que seria feita pelas personagens, mas que seria feita a posteriori, em estúdio, rodada em estúdio. E decidi-mo-la fazer no mundo de hoje, nós próprios, pelos países. E estavam previstas sete semanas de viagem em Janeiro e Fevereiro de 2020. E nós fizemos as primeiras cinco. Chegámos ao Japão e faltava o último país onde havia uma parte considerável dessa viagem, porque mesmo dentro da China, de Xangai e até quase próximo do Tibete, iríamos fazer 3000 quilómetros, acompanhando mais ou menos o curso do rio Yangtse. E quando chegámos ao Japão percebemos que o ferry boat que ia cobrir a distância entre Osaka, acho eu, e Xangai, tinha sido anulado uma semana antes devido ao COVID, à pandemia. E então, o que nós nós pensamos nessa altura? Bom, " Vamos esperar um mês, dois meses e vamos retomar a viagem quando for reposta a normalidade ". Porque nessa altura éramos tão ingénuos, como toda a gente, e achávamos que que era uma coisa meramente circunstancial e que não ia ocupar tanto tempo na nossa vida e ter tantas consequências como teve. E depois percebemos que estávamos enganados. O tempo foi passando, passou um ano, passaram dois anos e passado dois anos nós pensamos: " É impossível. Nós não conseguimos entrar na China para concluir a viagem. Portanto, vamos concluir a viagem em Lisboa, filmando com uma equipa que serão os nossos olhos. Com o material, eles vão filmar esta parte da viagem na China. E nós vamos estar em Lisboa ". Alugámos uma casa em Airbnb no bairro do Areeiro e estávamos lá durante a noite. Éramos poucos, dois ou três, e havia uma uma equipa na China que fez os tais 3000 quilómetros, enquanto nós estávamos sempre nessa casa no Areeiro E, enfim, fizemos o filme, assim. Concluímos essa parte da rodagem na China, assim, à distância. É fundamental falar do encadeamento entre planos a preto e branco e a cores. A cores são, de alguma forma, momentos algo etnográficos relacionados com o périplo. O preto e branco é a versão hodierna, actual. O porquê de sua opção por estes planos, ora a preto e branco, ora a cores ? O filme é quase o tempo todo a preto e branco. Eu diria, 90% é a preto e branco. Existem planos a cores por uma questão técnica. Porque nós filmámos em película e na película preto e branco existe apenas uma sensibilidade para 200 ASA para a luz. Portanto, 200 ASA é bom para fotografar, para filmar sequências durante o dia. Mas sequências à noite ou em interiores escuros é necessário outro tipo de sensibilidade: 500 T... que isso só existe em cores. E, portanto, nós decidimos filmar a maioria do filme a preto e branco em 200 D. E depois ter película a cores para em 10% do tempo, para situações de noite ou em interiores muito escuros. E a ideia era montar o filme completamente a preto e branco. Mas houve uma altura em que nós estávamos um bocadinho, estávamos a montar o filme, já tinham passado várias semanas, estávamos um bocado fartos do preto e branco e lembrámo-nos de que havia as cores ali. E portanto decidimos voltar a pôr. " Vamos voltar a pôr o plano tal como ele foi filmado a cores ! " E, portanto, não existe nenhuma lógica a não ser por uma questão meramente técnica. Não existe uma lógica racional, não existe um significado dos planos a cores quererem dizer qualquer coisa em especial. É só porque por uma questão técnica. Mas decidimos colocar mesmo que as pessoas se perguntassem " Porquê que estes planos são a cores... e o resto do filme é preto e branco ? "Não havendo razão nenhuma racional, é só pelo prazer de que é uma coisa que me que é importante para mim a lógica do prazer. OK, num filme a preto e branco... o que é que faz falta? Olha, de repente aparecem uns planos a cores e a cor é incrível ! Fala em prazer. Já há muito tempo que, imagino, tenha prazer em rodar com Crista Alfaiate. Agora há também a opção pelo Gonçalo Waddington. O porquê deste elenco ? Para nós foram escolhas óbvias: a escolha dos actores que fazem os dois protagonistas. O Gonçalo tem esta capacidade... Ele pode ter um ar assim, perplexo. E eu acho que ele é um actor com grande potencial cómico, mas com a capacidade de transformar esse lado de comédia numa coisa com um outro peso. E, portanto, ele pode fazer a transição entre comédia e drama muito com uma grande facilidade. E a Crista? Eu acho que ela, já disse noutras ocasiões... Eu acho que ela é a melhor actriz daquela geração à volta dos 40 anos. E, portanto, nem sequer pusemos nenhuma outra opção. Para nós, a Molly sempre foi a Crista Alfaite e ficámos muito contentes, depois com depois de ter filmado, com aquilo que... Percebemos, que não estávamos muito enganados relativamente a essas escolhas. E a questão da opção pelo português não foi complicada ? Não é complicada para Gonçalo Waddington, para Crista Alfaiate, mas você põe pessoas do Vietname, do Japão, nomeadamente, a terem diálogos bastante profundos em português. Como é que foi isso? Foi um desafio, imagino, também pô-los a contracenar em português fluente ?! Sim, o facto dos personagens serem britânicos e falar em português para mim foi uma opção, mais ou menos fácil... Porque eu sou português, não sou britânico. E, portanto, eu não queria... Eu acho que a verdade do filme também passa por isso. Ou seja haver um filtro teatral em que, como no teatro... Quando se faz em Portugal, ou que em França se faz Tolstoi ou se faz Tennessee Williams, faz-se em França e faz-se em Portugal. Em França faz-se em francês, em Portugal faz-se em português. E nessas peças de teatro as personagens têm os nomes que tiveram nas peças do Tolstoi: os nomes russos ou nomes americanos, no caso do Tennessee Williams. E é uma convenção, ou seja, as personagens falam na língua do país onde está a ser visto o espectáculo com os actores desse país. E no cinema há mais dúvidas relativamente a isso. Ou seja, parece uma questão completamente resolvida no teatro e no cinema menos. Porque no cinema existe mais a ideia de que o cinema está mais próximo da realidade da vida. Que eu acho que é uma falsa ideia. Há um realizador francês que já morreu, mas que foi muito importante para mim, que também fazia isto. E fez isto com uma grande lata e muito bem, que era o Alain Resnais ! Por exemplo, eu lembro-me de um filme dos anos 90 que era um díptico que se chamava de " Smoking " e " No smoking ", que era uma adaptação de uma peça inglesa feita com dois actores que entravam muito nos filmes deles dele. Esse filme é muito, muito importante para mim. E portanto, se o Alain Resnais pode fazer em francês, eu acho, também posso fazer em português. E obviamente que existe este lado de sermos todos mais ou menos dominados, colonizados por uma língua que é uma espécie de língua que é comum a todos os países. Foi a língua que ganhou a batalha das línguas, que é o inglês. E não é problemático ver, sei lá, ao longo da história do cinema, ver imperadores romanos a falar inglês de Brooklyn ! Ou ver, enfim... todas essas coisas passaram a ser normais. E porque não ter em português a mesma coisa? Porque não ter personagens britânicos a falarem português? Eu acho que é mais e mais verdadeiro fazer assim, porque... Também já foi língua franca no mundo [o português]... E finalmente, obviamente, Cannes você já vinha há muito tempo. Mas esta edição de 2024 fica na história por este prémio. Perguntar-lhe-ia: E agora, depois de Cannes e do seu prémio, como é que você se projecta para a sequência da sua carreira? Agora eu, antes de fazer o "Grand Tour", eu estava a tentar fazer um outro filme, um filme no Brasil, que é uma adaptação de um livro do Euclides da Cunha chamado "Os Sertões" e o filme chama-se "Selvajaria". E estive muitos anos a tentar fazer esse filme. E foi muito difícil, por várias razões. É um projecto exigente em termos financeiros e na altura em que eu estive a tentar fazer esse filme, havia um governo no Brasil que paralisou completamente os apoios públicos ao cinema. O governo do Bolsonaro e também apanhámos a altura do COVID. Portanto, foi tudo muito difícil e houve um momento em que eu pensei que tinha que renunciar a esse projecto. E foi muito complicado para mim, porque apesar de tudo, trabalhei anos nesse filme e estou convencido que é o projecto mais... com o qual eu acho que, provavelmente, existe um um potencial mais incrível do que tudo aquilo que eu fiz até hoje ! Ou seja, estou muito envolvido com esse filme e acho que existe a possibilidade de haver ali um filme que possa nascer, que seja muito, muito forte ! E é, portanto, quase que desistir do filme. Mas depois do "Grand Tour" e de repente passei para o "Grand Tour" e depois do "Grand Tour", o que tem acontecido foi que nós decidimos voltar a esse projecto. E tem havido notícias muito animadoras ! Ou seja, de repente, pela primeira vez, há financiamento do Brasil para esse filme. Tudo parece estar a andar muito rápido e assim uma perspetiva de haver a possibilidade de fazer, de filmar esse filme no final do próximo ano. Portanto, acho que isso também é uma consequência do prémio de Cannes e daquilo que aconteceu com o "Grand Tour em Cannes" e que existe um entusiasmo renovado em torno deste projecto. E vou aproveitar a conjuntura porque sabemos que isto vai mudando e nos momentos em que estamos em alta, é preciso aproveitar esse momento para poder concretizar coisas que estavam mais difíceis de concretizar.…
Foi em busca do tempo perdido e das memórias quase apagadas que o cineasta francês Pierre Primetens realizou o seu mais recente filme "La Photo Retrouvée" ["A Fotografia Encontrada"]. A obra autobiográfica parte da ausência de imagens da sua mãe e da sua infância para resgatar a sua própria história. É com imagens de arquivos de outras famílias que ele reconstitui um passado do qual não tinha registos, e que lhe foi negado, num percurso de vida que o leva a reencontrar-se com as suas raízes portuguesas. Pierre Primetens nasceu em França, três dias antes da Revolução dos Cravos. Perdeu a mãe portuguesa aos cinco anos e cresceu num ambiente que tentou extinguir a memória materna, as raízes lusas e uma parte da sua identidade. O filme “La Photo Retrouvée ” conta essa história e o título responde a outro filme sobre a emigração portuguesa “La Photo Déchirée” [“A Fotografia Rasgada”] de José Vieira, uma referência para Pierre Primetens que, tantos anos depois, acabou por encontrar a fotografia que lhe faltava. O título é uma referência ao filme de José Vieira que é um filme bastante conhecido sobre a emigração portuguesa para França. "La Photo Déchirée" conta que quando uma pessoa ia para França, deixava uma parte de uma fotografia rasgada e quando chegava ao destino, enviava a segunda parte da fotografia à família para mostrar que chegou em segurança. No meu filme uso imagens de outras famílias e só há uma imagem da minha família no fim que é da minha mãe que emigrou para França. Chamei-lhe “La Photo Retrouvée” porque encontrei essa única fotografia dela e o fim do filme é a revelação dessa fotografia. Foi a partir da falta de imagens da mãe que nasceu o filme. Pierre Primetens juntou filmagens em Super 8, rodadas entre 1940 e os anos 70 e reunidas num fundo de arquivos familiares [CICLIC Centre-Val de Loire]. Foi contando a sua história ilustrada com essas imagens alheias que começaram a ser as suas e agora são também do público. E assim foi reconstruindo uma memória retalhada, como uma colagem aleatória que foi ganhando sentido ou como um puzzle que se foi completando com peças oriundas de diferentes colecções. “ Não tenho fotografias minhas quando era criança. Há uma falta de imagens na minha família. No filme, conto porque é que esta família não fez nenhuma imagem ”, descreve. Pierre Primetens cria um filme com múltiplas leituras e entrelaçamentos, através do cruzamento do texto autobiográfico, com imagens de arquivo de outras famílias, sons também de arquivos, incluindo uma canção de embalar portuguesa, numa associação de ideias e imagens que não pretende ilustrar mas abrir possibilidades. O único fio condutor é a história de um menino de cinco anos que perde a mãe e fica entregue a um pai que decide apagar completamente a mãe das suas vidas, com toda a violência que isso acarreta para uma criança. Até ao dia em que, já adulto, um familiar aparece à procura dele e o reencontro com Portugal acontece. Pierre Primetens já tinha feito uma trilogia autobiográfica com "Un voyage au Portugal", "Des vacances à l’Île Maurice" e "Contre toi" , em que já estava inscrita uma certa viagem em busca de quem se é. "La Photo Retrouvée" talvez seja o completar de um ciclo sobre essa tentativa de resgate de memórias e identidade. O filme já foi apresentado nos festivais Chéries-Chéris Paris, Sicilia Queer filmfest 2024, Queer Lisboa 2024, Family Film Project Festival 2024 e États généraux du film documentaire de Lussas 2024.…
O historiador e co-organizador do livro "O Mundo de Amílcar Cabral", Victor Barros, apresentou-nos o livro que aborda as várias geografias que Amílcar Cabral percorreu; Portugal, Paris, URSS ou ainda Cuba, e como a sua luta se inseriu num contexto de revoluções no sul global. "Este livro tenta trazer para o público um conjunto de ensaios que nos dão uma visão mais alargada dos vários palcos por onde passou Amílcar Cabral" , começa por explicar Victor Barros. RFI: O historiador Victor Barros acaba de publicar o livro "O Mundo de Amílcar Cabral", uma obra redigida por três coordenadores. O livro refere-se ao contexto político e social vivido por Amílcar Cabral, líder revolucionário e intelectual africano nas décadas de 50 a 70. O mundo de Amílcar Cabral foi um mundo de resistência contra o colonialismo, de procura pela soberania africana e pela justiça social, mas foi muito mais? Victor Barros: Foi muito mais, inclusive o livro que acabamos de coordenar -eu e os meus dois colegas do Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa - comprova isso. É um livro que nós tentamos trazer para o público geral, com um conjunto de ensaios que abordam temas diversos, temas que conectam com as múltiplas geografias onde Cabral circulou, mas também que nos dá uma visão mais alargada dos vários palcos por onde passou Amílcar Cabral. Também nos dá uma percepção mais ampla daquilo que é a geopolítica do mundo na altura. Nós conseguimos captar a história do mundo dessa altura a partir da trajectória e das conexões e interações políticas e geopolíticas que Amílcar Cabral teceu nessa altura. Que pontos geográficos são abordados neste livro? Poderíamos tomar isso como percurso, mas teríamos de enquadrar esses percursos. Ou diria, cada percurso dentro de um contexto muito específico, de um contexto geográfico muito específico do processo da luta. Esses percursos são percursos que conectam Amílcar Cabral dentro da cartografia da luta. Estamos a falar de espaços tanto com Portugal, onde ele estudou e começou o processo de militância, passando por Paris, onde ele tinha militantes e simpatizantes da revolução do PAIGC, da revolução anticolonial, passando pela URSS até Cuba, China e vários outros pontos do globo. Dá-nos uma percepção dos movimentos geográficos, das viagens, das circulações, mas também ajuda-nos a compreender como é que a luta do PAIGC, conduzida por Amílcar Cabral é uma luta que conecta simultaneamente várias geografias e várias cartografias e pontos e interacções de luta. Uma luta que se conecta também com outras lutas e que acompanha outros movimentos sociais? Sim, exactamente. É uma luta que se conecta com várias outras lutas porque este era um dos princípios essenciais do lema do Cabral e do PAIGC, criar ligações entre lutas, ou seja, colocar a revolução anticolonial para a independência da Guiné e Cabo Verde dentro de um contexto geral específico das lutas anticoloniais no sul global e das lutas para a independência das colónias portuguesas dentro do contexto global das revoluções anticoloniais que estavam a decorrer no terceiro mundo. Estamos a falar de lutas dentro de uma cartografia de várias outras lutas, na qual a luta do PAIGC para a independência da Guiné e Cabo Verde representava apenas uma antena de várias outras manifestações e demandas pela soberania e pela independência e de outros povos. Em todos os momentos, o PAIGC reclamou que a sua luta seria um contributo para a emancipação não só dos guineenses e dos cabo-verdianos, mas também para a própria emancipação dos portugueses na metrópole que estavam subjugados pela ditadura de Salazar. Era um contributo de uma revolução para as revoluções que estavam a decorrer, para a emancipação de outros povos que estavam sob dominação e da ocupação imperialista e colonial. Aquando da redacção deste livro, houve alguma história que despertou o seu interesse. Uma história que desconhecesse e que quis absolutamente contar nesta publicação? Sim, particularmente no ensaio que eu escrevi, um dos episódios que despertou a minha atenção foi o facto de, a dada altura, perceber que Cabral faz isso com muita precisão. Ele dá o número de litros de sangue, sangue fresco que era transportado a cada 15 dias de França para Conacri. Esse sangue era utilizado para tratamento dos feridos de guerra. Então ele dá, com precisão, e no ensaio têm lá os elementos, essa informação. É incrível. Esse sangue era sangue colectado através de voluntários que faziam parte do Comité de Apoio Francês, que eram militantes anti-colonialista, anti-imperialistas e simpatizantes da revolução anticolonial guineense do PREC e que se disponibilizavam a colectar no fim-de-semana, através de campanhas de recolha de sangue, clandestinamente, obviamente, porque tratava-se de um comité informal e de um conjunto de outras ramificações na forma a preservar o sangue, até chegar ao hospital de campanha, onde estavam confinados os feridos de guerra. Esse detalhe foi um detalhe bastante interessante, no sentido em que, quando imaginamos ou quando pensarmos a delicadeza do processo de preservação, que é o tratamento que um sangue fresco deve ter para ser preservado e depois para ser colocado à disposição de pessoas que precisavam num contexto de guerra, ou seja, de sangue que transita da periferia de Paris e que passa por vários outros processos para chegar a Boké e que acaba por ser útil para a manutenção do esforço de guerra dos combatentes do PAIGC e para a sobrevivência de muitas pessoas. Estamos a falar de uma grande quantidade de sangue, existe uma descrição da quantidade de litros? Sim, estamos a falar de uma grande quantidade. Se pensarmos duas coisas: primeiro, se pensarmos no contexto da época e depois se pensarmos na temporalidade entre a recolha e a partilha. A cada 15 dias, segundo Cabral, chegava ao Hospital de Boké, a partir do Paris de avião, 80 litros de sangue. É um número significativo para o contexto da época. Isto é revelador da mobilização e do impacto da boa reputação política que a revolução anticolonial do PAIGC estava a ter à escala internacional. Este aspecto permite perceber à escala transnacional aquilo que é a persuasão que a luta do PAIGC estava a ter em indivíduos. Estamos a falar de indivíduos que vão a comités de apoio, que são grupos informais de militantes e de activistas e simpatizantes que reúnem e mobilizam pessoas para fazerem doações tanto de sangue como de roupa, de cadernos e materiais escolares para estudantes e para as escolas, das zonas libertadas, de alimentação, de medicação, ou seja, de recolha de medicamentos. Como é que a luta do PAIGC estava a ter impacto em pessoas no Norte global, ou seja, na Europa, de forma a potenciar nessas pessoas um ímpeto para essas pessoas produzirem uma agência e essa agência retornar de volta, em termos de resultado, de colecta de apoio para os militantes e para as pessoas nas zonas libertárias do PAIGC. Isto é extremamente importante, na medida em que esse impacto é de tal forma que quando a Guiné e Cabo Verde ganham independência, no programa de formação de militância política, o conceito de solidariedade acabou por entrar no léxico da educação política de forma a demonstrar que a luta do PAIGC não foi uma luta conectada com várias frentes de luta e com várias pequenas bolsas de resistência e de colaboração e de solidariedade, dado não só por país de forma formal, ou seja, de Estado para o movimento de libertação, mas também dado de forma como pequenos grupos informais da sociedade civil que apoiavam as demandas de independência da Guiné e Cabo Verde. No colóquio que decorreu na cidade da Praia em Setembro, apresentou o texto "Cabral e as pontes para o novo diálogo Norte-Sul e Sul-Sul" . Que diálogo é esse? Normalmente, costumamos, por regra, numa perspectiva eurocêntrica, tendemos a imaginar ou a analisar os processos históricos do norte para o Sul. Ou seja, a Europa é a causa dos eventos que acontecem noutras partes do mundo. Este é o paradigma dominante, hegemónico, eurocêntrico. Então, a perspectiva aqui é do sul para o norte, que é como é que sujeitos históricos do Sul, neste caso da Guiné, Cabo Verde, África, estão a produzir agências e essas agências estão a impactar a imaginação política de actores no norte global, na Europa. A segunda questão essencial também é perceber como é que as acções desenvolvidas no sul global, através de sujeitos históricos africanos acabaram por gerar interações com sujeitos na Europa. Ou seja, eles conseguiram persuadir outros sujeitos políticos que acabaram por introduzir nas suas linguagens políticas na Europa aquilo que são as demandas dos actores e dos sujeitos políticos africanos e sul-sul. Basicamente porque a conexão que se fez entre a luta ou as lutas na Guiné e Cabo Verde e outras colónias portuguesas com outras lutas que estavam a decorrer no sul global, também é um aspeto a ter em conta e as várias conferências que foram realizadas, conferências internacionais e destaco a Conferência de Cartum, de Janeiro de 1969 - que é uma conferência que acaba por ter um impacto tremendo na medida em que é realizado em Cartum, no Sudão. A partir dessa conferência há um conjunto de movimentos que desencadeiam na Europa, com a criação de comitês, com a criação de grupos de apoio, com a criação de grupos que trabalham especificamente na questão da propaganda, ou seja, de dar a ver para a opinião pública internacional e sobretudo europeia, aquilo que eram as lutas que estavam a ser desenvolvidas no sul global, nomeadamente na Guiné, em Angola, Moçambique e outros territórios. Esse aspecto do sul para o norte dá lugar a esses sujeitos históricos que são sujeitos importantes, em vez de olharmos para a história da descolonização e da luta apenas a partir das lentes da metrópole e dos seus sujeitos da metrópole, é ver pelo viés dos sujeitos africanos, da agência dos africanos, da forma como as agências dos sujeitos históricos africanos impactaram a imaginação política de sujeitos históricos e de actores políticos na Europa e noutras partes do mundo, inclusive nos Estados Unidos. Por que é que teve de ser a conferência de Cartum a evidenciar, a dar visibilidade ao que estava a acontecer em África. Os países ocidentais estavam cientes e acompanhavam o que estava a acontecer em África? Sim, os países ocidentais sabiam, mas uma boa parte dos países ocidentais eram na altura e continuam a ser membros da NATO, inclusive Portugal. Sendo membros da NATO, esses países estavam a apoiar a guerra colonial, ou seja, apoiavam Portugal com vários meios na manutenção do esforço de guerra, inclusive com equipamentos militares. Apoiavam politicamente Portugal com o veto ou simplesmente com abstenção, quando resoluções das Nações Unidas tentavam condenar o colonialismo português e a guerra colonial nas colónias portuguesas. A Conferência de Cartum é importante na medida em que ela põe em cena vários tipos de actores. Põe em cena actores estatais, ou seja, Estados que apoiavam movimentos de libertação. Ela põe em cena os movimentos de libertação enquanto tal, enquanto actores que estão a produzir a história da luta pela independência. Põe em cena também os grupos de militância activista política que vêm de diferentes partes do mundo da Europa, inclusive do Brasil, do Vietname, da China, etc. Cartum desencadeia um conjunto de resoluções. Nessas resoluções, Cartum outorga, ou seja, legitima a grupos individuais nos países respectivos no Ocidente, de formarem grupos e comités de apoio, denunciando o envolvimento dos seus respectivos governos no apoio à guerra colonial. É essa a questão que é fundamental levar em conta da importância e do peso que Cartum tem ao estimular esse processo. A criação destes movimentos vem mudar o percurso da história? Vem mudar o percurso da história depois, sim. A partir de Cartum surgem na Europa vários outros comités de apoio, comités informais, vários outros grupos de apoio. Cartum vai dar lugar a uma outra conferência que vai acontecer nos Países Baixos, na Holanda, e levando para lá os mesmos comitês de apoio, os mesmos movimentos de solidariedade, os mesmos movimentos de libertação. É da Holanda que também se prepara, influenciado por Cartum, a Conferência de Roma, que acontece depois - em que os líderes dos movimentos de libertação serão recebidos pelo Papa. Cartoon está na genealogia desse processo e do impacto posterior que os movimentos de libertação acabam por ganhar à escala transnacional. Cartum prepara todo um caminhar porque depois de Cartum há duas outras conferências chaves que acontecem, como eu disse, na Holanda e depois em Roma. E isto tem um impacto forte em termos daquilo que são as conquistas do ponto de vista político e do ponto de vista moral, daquilo que é a imagem dos movimentos de libertação que acabam por conquistar à escala transnacional.…
De 15 a 23 de Novembro decorre em Nantes, França, a 46a edição do Festival des 3 Continents (Festival dos Três Continentes). Um encontro que apresenta longas-metragens provenientes de África, América Latina e Ásia. A figurar na selecção oficial estão dois filmes lusófonos: “Manas” de Marianna Brennand e “Hanami” da cabo-verdiana Denise Fernandes. De 15 a 23 de Novembro decorre em Nantes, França, a 46a edição do Festival des 3 Continents (Festival dos Três Continentes). Um encontro que apresenta longas-metragens provenientes de África, América Latina e Ásia. Em entrevista à RFI, Aisha Rahim, programadora do Festival des 3 Continents , sublinha que a edição deste ano visa homenagear duas grandes figuras indianas: a actriz Shabana Azmi ao cineasta Raj Kapoor, “também conhecido Charlie Chaplin, do cinema indiano”. A figurar na selecção oficial estão dois filmes lusófonos: “Manas” de Marianna Brennand e “Hanami” da cabo-verdiana Denise Fernandes. “Hanami” de Denise Fernandes foi filmado na Ilha do Fogo, em Cabo Verde. Conta a história de uma família da “remota ilha vulcânica” de onde todos querem partir, mas onde Nana aprendeu a ficar. Nós, enquanto programadores, vemos muitos filmes, visitamos festivais, chegam-nos filmes que nos são enviados pelos mais diversos interlocutores da nossa indústria do cinema e penso que teremos visto o “Hanami” no Festival de Locarno. Foi uma uma descoberta para nós. Este filme da Denise Fernandes é a sua primeira longa-metragem. Uma das raras longas metragens de ficção filmadas em Cabo Verde.” Questionada sobre o que a seduziu neste filme, Aisha Rahim fala no “ olhar original ” e “ carácter autoral ” da película: “ Eu gosto muito de “Hanami” pela nova visão do mundo que ele também põe em prática. O filme, em vez de se posicionar do lado do sofrimento, da separação, posiciona-se do lado da união ou da reunião, do diálogo, do perdão, da cura, da reconciliação, neste caso entre uma mãe e uma filha. E neste sentido, penso que é um filme, também ele único, que nos traz uma nova visão do mundo. ” “Manas” é a primeira longa-metragem de ficção de Marianna Brennand e resulta de uma década de investigação. O filme retrata a vida de Marcielle, que vive na Ilha do Marajó, na Amazónia, lugar onde meninas e mulheres são sistematicamente violadas, exploradas e abusadas. A 46a edição do Festival des 3 Continents (Festival dos Três Continentes), decorre em Nantes, de 15 a 23 de Novembro. Um encontro que apresenta longas-metragens provenientes de África, América Latina e Ásia.…
A 4ª edição do DjarFogo International Film Festival está a decorrer esta semana em Cabo Verde. O evento destaca filmes tanto do continente africano quanto da diáspora, e tem como tema "Libertação através da Cultura". Esta edição presta uma homenagem ao centenário de nascimento de Amílcar Cabral, com uma selecção de filmes que abordam temas como "resistência, identidade e a luta pela liberdade", como explica o director do festival, Guenny Pires. RFI: Como é que arrancou o festival? Genny Pires: Arrancou muito bem. Não podia ter sido da melhor forma, uma vez que tivemos actividades na Universidade de Cabo Verde, actividades também no Centro Cultural Português com a exibição do filme Mário, sobre Mário Pinto de Andrade. Tivemos uma sala cheia com estudantes e professores e vários convidados. Foi uma coisa muito linda. O festival está a decorrer da melhor forma possível, tivemos uma excelente abertura com a apresentação de um grupo, as Batuquinhas PBS, que apresentaram três temas ligados à luta de libertação e músicas muito importantes no contexto da criação ou da reafirmação da identidade cabo-verdiana. Estamos muito felizes e esperançosos de que o projecto vai continuar e vai ter cada vez mais oportunidades de poder trazer mais cineastas aqui e contar com a contribuição, de forma humilde, da produção que se faz no país, mas sobretudo trazer o mundo para Cabo Verde e poder fazer com que o mundo possa filmar aqui em Cabo Verde e possa partilhá-lo com o resto do mundo. Como sabemos, Cabo Verde é um país que tem uma diáspora muito grande. Este festival focaliza nos filmes do continente africano; temos 25 filmes do continente e os outros filmes da diáspora, que também são filmes daqui de Cabo Verde e estamos muito agradecidos e muito contentes com a abertura. O festival continua nos próximos dias na Ilha do Fogo. Vamos ter uma homenagem especial ao ex-Presidente de Cabo Verde, o comandante Pedro Pires que foi agraciado pelo DjarFogo International Film Festival com o prémio ícone cultural. Estamos satisfeitos e que temos muito, muito trabalho pela frente. Na Ilha do Fogo vamos ter actividades nas escolas e vamos aos três concelhos da ilha. Também teremos a finalização do evento com a entrega de prémios. O festival decidiu entregar 20 a 25 prémios durante o encerramento do festival. O festival tem como tema Libertação através da Cultura . O que é que este tema significa e como é que se reflecte nos filmes seleccionados? É precisamente por causa da homenagem que estamos a fazer desde o início do ano em torno da personalidade de Amílcar Cabral. Este tema reflecte a luta de libertação de África, dos países que falam português. Mais do que isso, os filmes foram seleccionados com base nos temas dos filmes que vão de encontro com o tema principal do festival. Começando pelo filme de Samir Amin, que é franco-egípcio francês, um intelectual e político, este filme passou na Universidade de Cabo Verde. Temos um outro filme sobre música em Lisboa... Tudo a ver com africanidade que discute questões culturais e identitárias. Que filmes ou eventos específicos estão alinhados ao centenário de nascimento de Amílcar Cabral? Temos o filme Sonhos de uma Revolução , um filme de Moçambique. Temos um filme da Guiné-Bissau que Mon di Timba . Temos outro filme da Guiné-Bissau que é antigo e temos um filme também de São Tomé sobre aquela história de 1953 que morreram várias pessoas no massacre.. de Bafatá... Sim. Há filmes desses países, outros da diáspora, por exemplo, temos um filme sobre Oakland, na Califórnia, que trata questões de afro-descendentes, que fala sobre a questão da brutalidade policial e discriminação. Depois temos filmes de animação, um filme da Austrália que também vai, neste sentido, de redescobrir a sua pessoa através do cinema. Todos os filmes que temos têm a ver com o tema principal do festival, que é sobre a liberação através da cultura. Nós escolhemos este tema para poder fazer um casamento agradável com o centenário de Amílcar Cabral. Como referiu, o cinema permite-nos reflectir sobre o mundo e sobre as problemáticas actuais, nomeadamente sobre a questão da violência racial. É importante que a arte e, neste caso, o cinema, crie um espaço para o pensamento? É verdade que se tivermos em conta que o cinema como uma das ferramentas mais poderosas para ensinar, até para conhecermos quem somos, os filmes e o cinema podem ajudar-nos a desbravar e conhecermo-nos. Mas, mais do que isso, dar-nos a possibilidades de, por exemplo, contarmos a nossa história a partir da nossa própria perspectiva e de uma perspectiva africanista, mas também numa perspectiva de mistura de culturas. Este festival é uma forma de também as pessoas poderem ver coisas que, muitas vezes, são invisíveis ou acessíveis de outra forma. Esse é um dos principais desafios desta 4ª edição? Sim, porque um país pequeno como Cabo Verde, com várias dificuldades, sobretudo num ano de eleição em que as dificuldades são muito maiores, há uma certa tendência a esperar até o último minuto para resolverem as coisas. Para nós, tudo isso é uma aprendizagem constante, uma aprendizagem agradável, embora com vários constrangimentos, sobretudo financeiros porque queremos trazer vários cineastas e queremos criar condições porque o cineasta vive de ir ao festival e é ali que, de facto, pode ser reconhecido e pode trocar experiências por criar co-produções. Nesse sentido, este ano propomos oito projectos de documentários, de filmes documentários, com o nosso parceiro da Colónia Pitch the Doc, que vai seleccionar oito projectos, entre os quais três destes projectos de Cabo Verde. Cabo Verde ainda não tem uma indústria de cinema. Estamos numa fase muito incipiente, de modo que a nossa preocupação é sempre trazer algo que possa ajudar localmente, mas também que possa ir entrando e sinalizar o cinema cabo-verdiano. É poder contribuir para o desenvolvimento da sociedade cabo-verdiana e poder projectá-lo e criar uma marca de Cabo Verde. Estamos muito animados e muito determinado e confiante no resultado que terá que levar o seu tempo naturalmente, mas pouco a pouco estamos a dar um salto e estamos a internacionalizar cada vez mais este cinema.…
A Guerra Civil em Moçambique é um tema que tem sido alvo de um silêncio que não tem contribuído para a redenção do país. Para revelar histórias não contadas e fazer o filme "As Noites Ainda Cheiram a Pólvora" (recentemente apresentado no Festival DocLisboa), o realizador Inadelso Cossa regressou à aldeia da avó. Na aldeia, o realizador junta memórias fragmentadas da infância vivida durante a guerra civil em Moçambique, recordações dispersas que a avó se esforça por partilhar e os testemunhos de perpetrador e vítima. O documentário , marcado por um arrojado sentido estético e uma mistura entre realidade e ficção, é como a fogueira onde, com o cair da noite, se reunia toda a aldeia e se ouviam histórias. Num desafio para quebrar silêncios e reduzir novas tensões, Inadelso Cossa tira da escuridão uma parte dos fantasmas da guerra civil.…
A exposição "Pour voir, ferme les yeux" [ Para ver, fecha os olhos] da artista plástica portuguesa, Ana Vidigal, está patente até ao dia 9 de Março, no Centro de Criação Contemporâneo Olivier Débre, em Tours. Em entrevista à RFI, Ana Vidigal diz que é pintora graças ao 25 de Abril, reivindica-se feminista para não ser masoquista e alerta para as constantes ameaças à democracia. RFI: Num mundo onde somos constantemente bombardeados pela informação, onde as câmaras dos telemóveis se sobrepõem ao nosso olhar. Que mensagem pretende passar com esta exposição? Ana Vidigal, artista plástica portuguesa: penso que as pessoas devem, em vez de reagir instintivamente, parar para pensar em que situação estamos a viver. Hoje em dia, aqui na Europa ou em qualquer parte do mundo. Daqui a menos de um mês, vamos assistir ao que se vai passar nos Estados Unidos, ficámos todos um pouco esperançados com esta nova candidatura. Confesso que também fiquei contente com o resultado das eleições aqui em França, porque seria, na minha opinião, perigosíssimo que a França perdesse valores democráticos, digamos assim, que demoraram muito tempo a ficarem consolidados. Porém, tive muita pena que Portugal comemorasse os 50 anos do 25 de Abril com 50 deputados da extrema-direita. Uma coisa que nunca tinha acontecido. Talvez devamos parar um pouco para pensar que devemos tratar melhor a democracia que temos. A democracia também “se gasta” e no dia em que ela se gastar, vai ser muito difícil recuperá-la. Estamos tão baralhados com a informação toda que temos, com toda a confusão mental que as imagens nos provocam, que fechar os olhos para pensar, nessas mesmas imagens, não quer dizer fechar os olhos para não ver! É fechar os olhos para pensar e poder fazer uma opção do que queremos ver. Nas suas obras explora o universo da verdade e da mentira. Em muitas das suas obras há uma parte que se pode ver e a outra não pode.Há presença do Pinóquio. É uma alusão ao que é verdade e ao que é mentira? Sim, hoje em dia estamos muito sujeitos a isso. São valores que nos foram incutidos desde crianças, para não mentirmos. Mas é inevitável que todos nós mentimos ao longo da vida. A mentira está a tornar-se cada vez mais uma ferramenta que é utilizada sem limites. Acho isso muito perigoso. No trabalho que faz recorre frequentemente a colagens, materiais têxteis, materiais ligados à sua infância- ao passado da sua infância- ou com carácter biográfico. Ao usar estes materiais, que importância lhe dá? A minha primeira escolha é sempre porque tenho uma grande identificação formal com esses objectos. Porém, a história dos objectos também me interessa bastante e gosto de saber [a sua história] mesmo quando eles me são oferecidos. Gosto de saber o que é que as pessoas fizeram com eles. Há sempre qualquer coisa a aprender com esses materiais. Muitos dos materiais com os quais trabalha foram-lhe deixados pela sua avó… Sim, a minha avó era uma excelente arquivista e guardou todas as coisas de família. Fê-lo porque podia, tinha uma casa grande. Foi professora, mas quando se casou deixou de trabalhar e, portanto, pôde fazer isso. E tinha esse prazer de delicadamente guardar todas essas coisas que chamava recordações. E foi extremamente generosa porque, era a única neta rapariga, disse-me sempre que podia mexer em tudo. Que podia abrir as caixinhas, os pacotinhos, as fotografias e os álbuns. E eu, confesso-lhe, espatifei tudo. Nesta exposição há uma instalação onde a Ana coloca uma série de porta-retratos da sua família, todos virados para a parede, não se vê as fotografias. Uma obra que lhe foi pedida para trabalhar a memória. É importante proteger-se a memória da família? A memória é uma coisa que trabalhamos e também só mostramos aquilo que queremos. Quando me pediram para fazer um trabalho sobre a memória, lembrei-me imediatamente dessas imagens e da imagem que eu tinha do escritório do meu avô. Em casa, o meu avô tinha uma prateleira, ao longo de todo o escritório, com todas as fotografias de antepassados familiares. Quando se desmanchou essa casa, o meu pai quis imediatamente deitar fora aquelas molduras todas e ficar só com as fotografias. Eu não deixei porque pensei sempre que aquilo era a memória que eu tinha do meu avô e quis sempre preservar aquilo. Sabia que um dia eu iria utilizar esses porta-retratos em qualquer coisa. Não sabia quando, nem como e nem em que contexto. No 25 de Abril a Ana tinha 14 anos… Foi em Abril e eu fiz 14 anos em Agosto. Que lembranças e vivências trouxe dessa época para o seu trabalho? Eu não trouxe propriamente nada do 25 de Abril para o meu trabalho. A única coisa que aconteceu é que hoje sou pintora porque houve o 25 de Abril. O 25 de Abril foi a melhor coisa que me aconteceu na vida. Foi muito bom ter acontecido com 13 anos, porque o resto da minha adolescência foi passado em liberdade. Eu não sabia que não se era livre. Pensava que toda a gente vivia como eu, o que não era verdade. Eu vivia numa bolha, andava num colégio de freiras, só convivia com pessoas da minha situação familiar e, portanto, achava que era tudo assim. Com o 25 de Abril caí na realidade. E foi óptimo ter caído na realidade porque pude, tipo esponja, criar os meus próprios valores. Valores que a democracia me deu. A sua mãe dizia-lhe que era preciso ser uma menina limpinha. A Ana criou uma obra a que deu o nome “ Menina limpa e a menina suja” . O 25 de Abril permitiu-lhe ser a menina suja, a menina que se porta mal? O 25 de Abril permitiu que eu tivesse a noção de que podia optar e podia fazer escolhas e que essas escolhas teriam consequências. Coisa que possivelmente não aconteceria se não tivesse havido o 25 de Abril. Nesta exposição faz também uma homenagem às várias pintoras portuguesas… O 25 de Abril trouxe às mulheres portuguesas uma coisa absolutamente maravilhosa, que foi aquela ideia de liberdade. Mas nunca esquecer que o nosso 25 de Abril aconteceu em 2008, quando foi aprovada, na Assembleia da República, a despenalização da interrupção voluntária da gravidez a pedido da mulher. Só aí -nós mulheres portuguesas- fomos donas do nosso próprio corpo. Não quer dizer que a lei seja completamente cumprida. A Ana afirma que se tornou feminista para não ser masoquista… Claro! As mulheres ganham menos que os homens. As mulheres são preteridas porque engravidam. Com todas essas injustiças, só se eu fosse masoquista é que achava que essas coisas estavam correctas. Quando eu percebi que o movimento feminista só lutava para por um fim a essas desigualdades, exigir a paridade...É lógico que me tornei feminista. Nesta exposição o público pode ver a obra "Tornei-me Feminista para não ser Masoquista"Nela vêem-se imagens da Ana com pioneses colados na cara, outra onde tem um saco na cabeça e a última surge com uns cornos de diabo. Que mensagem pretende passar? Foi um domingo à tarde e é assim que se chama esse vídeo. Eu não gosto de trabalhar ao fim-de-semana, mas estava um bocado entediada e fui para o atelier. Não me apeteceu pintar e resolvi começar a fazer aquilo e foi uma sequência de coisas que foram acontecendo e mais tarde, quando eu vi o vídeo, comecei a identificar situações com aquelas coisas que eu tinha feito. Na obra está a frase de Mae West: ”Quando eu sou boa, sou boa. Mas quando sou má, sou ainda melhor”. Ao fim e ao cabo estou quase a rir-me de mim própria. Quer dizer, porque já me vi em situações tão caricatas que pensava que nunca me iria ver na vida, que só posso rir. Não posso fazer mais nada. Atrás de nós está uma obra que a Ana fez em homenagem à Masha Amini. O que é que representa esta obra? Esta obra representa exactamente esse retrocesso. Há imensas obras, que estão aqui na exposição, onde utilizo [as revistas francesas Paris Match e Jour de France] que eu li desde miúda, porque a minha avó as assinava. A censura não as proibia porque só deviam ver a Brigitte Bardot e o Alain Delon, nem percebiam que à frente tinha o Vietname e críticas ao Xá da Pérsia. Eu lembro-me de ver imagens do que era a Pérsia, agora o Irão, com todos os defeitos possíveis e imaginários, porque era uma ditadura, mas havia também o outro lado, que era o de abertura para as mulheres terem alguma liberdade. Hoje em dia, no Irão as mulheres são completamente esmagadas. Uma mulher que é morta porque não pôs o véu como meia dúzia de homens acham que ela deve pôr é inconcebível. Todavia é isto que acontece na maior parte dos países. Uma obra de arte também é uma arma para se veicular aquilo que se pensa? Acredito que se isso acontecesse, se calhar não teria havido a Segunda Guerra Mundial, não teria havido Hiroshima. Isto porque todos os artistas se manifestaram contra esse tipo de posições que os políticos tinham, mesmo contra o nazismo e [nada mudou]. Mas eu gostaria que fosse. Na sua obra há também referências a um acontecimento que é eminentemente político, a guerra colonial. Há um desenho que o seu pai fez das ex-colónias portuguesas. O seu pai que esteve na guerra na Guiné-Bissau. Que recordações guarda desse tempo? A Ana fez uma instalação com a correspondência que os seus pais trocaram, nesse período, “Penélope” . Sim, o meu pai fez a tropa, no tempo normal, e depois em 1967 foi chamado a segunda vez para fazer o curso para capitão. Esteve dois anos na Guiné-Bissau , esteve sempre no mato. Mas como ele era oficial veio a Lisboa, um mês em cada ano, mas ficámos praticamente dois anos sem o ver. Apesar de sermos crianças e de termos sido muito protegidos pela minha mãe, pelos meus avós, penso que tínhamos a noção de que ele poderia não voltar, poderia levar um tiro. Claro que também tínhamos aquela noção de que ele era o bom e os outros eram os maus, coisa que não era correcta. Hoje temos outro tipo de informação, sabemos outro tipo de coisas. Naquela altura não sabia que vivíamos uma ditadura. Eu penso que não há ninguém da minha geração que não tenha tido um primo, um tio, um pai ou um irmão na guerra colonial. A Ana considera que nunca se olhou para essas feridas. Nunca se olhou para o facto de que as mulheres ficaram à espera, sozinhas… Sim, é uma lacuna. Nunca se falou das mulheres que cá ficaram. Aguentar o barco porque os homens iam e as mulheres ficavam. Estamos aqui em frente a duas obras- dois labirintos – onde explora o passar do tempo. De que falam estas obras? São obras, em termos formais, sobre a alienação do espaço e do formato, em termos de concepção, de uma série que se chama “Matar o Tempo” . Foi uma série que fiz a partir de labirintos encontrados em revistas, que estão nas salas de espera dos hospitais, num período da minha vida em passei muito tempo nessas salas. Estava a acompanhar uma pessoa que estava a fazer uns tratamentos muito complicados e era uma maneira de eu matar o tempo e de sobreviver. Numa entrevista que deu, em 2010, à jornalista Anabela Mota Ribeiro, ela descreve a da seguinte forma: Ana Vidigal pinta quem é como os outros escrevem quem são. Continua a rever se nessa definição. Pinta como os outros escrevem quem são? Não sei! Mas é-lhe mais fácil falar de si e da sua história através da pintura, de manter vivo o universo infantil? Como são materiais que eu utilizo, penso que essa afirmação está correcta. Eu acho que sim. E como eu digo, muitas vezes, trabalho com esses materiais há 40 anos. Se em 2010 era assim, em 2024 também. Continuo a trabalhar de forma diferente, mas com os mesmos materiais. E nessas caixas ainda há mais materiais? Há imenso material. Tenho imensa coisa. Acho até que é um problema para as minhas sobrinhas. O que é que vão fazer com aquilo um dia que eu vá, como eu costumo dizer, para o Alto São João? Vai ser um problema... Mas acho eu, nestas coisas, sou muito prática. Tenho um amigo que é também um excelente arquivista, bastante mais novo que eu, e vou dizer-lhe para ajudar em tudo. Temos de ser práticos e pensar nestas coisas. Não deixar problemas para as gerações seguintes.…
A
Artes
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Em Paris, a Revolução dos Cravos saiu à rua na recta final das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril para mostrar aos parisienses e aos visitantes de todo o Mundo não só o dia emblemático da democracia portuguesa, mas o processo revolucionário que se seguiu. Uma exposição de acesso livre permite até dia 20 de Novembro ver os momentos-chave desta revolução. "La Révolution des Œillets 25 avril 1974 : Ode à la démocratie" é uma exposição de 24 fotografias que pode ser vista na vedação da Tour de Saint Jacques, um dos monumentos mais emblemáticos de Paris, e que dá precisamente para a rue Rivoli, uma rua de comércio por excelência na capital francesa. Esta ode é guiada pela lente de três fotógrafos que estiveram em Portugal entre 1974 e 1976 Alécio de Andrade, Jean-Claude Francolon et Guy Le Querrec. Yves Leonard, historiador francês especialista na História de Portugal, é o conselheiro científico desta exposição e explicou em entrevista à RFI como foi feita a selecção destas fotografias. " A selecção é um exercício muito difícil de fazer, desde logo porque houve muitos fotógrafos e nós decidimos escolher três, dois franceses e um brasileiro. A vontade foi de fazer uma selecção não só sobre o dia do 25 de Abril, até porque nesse dia só Jean-Claude Francolon estava em Lisboa, mas também depois do 25 de Abril, do início de Maio, da Primavera de 74 e todo o processo durante um ano, até às eleições para a Constituinte em 75 ", declarou o historiador. Esta história é contada a quem passa nesta atribulada rua parisiense através de 24 fotografias, desde as chaimites nas ruas, até ao regresso de grandes figuras da revolução como Mário Soares ou Álvaro Cunhal, até ao regressos dos portugueses que viviam nas colónias, as organizações sindicais um pouco por todo o país e ainda a primeira eleição livre a 25 de Abril de 1975 que elegeu os deputados da Assembleia Constituinte. A ambição desta exposição é assim devolver uma revolução popular ao povo, agora de uma das maiores capitais do Mundo, dando a conhecer aos franceses e aos visitantes de Paris a história da Revolução dos Cravos para além do dia 25 de Abril de 1974. " É um processo revolucionário, é uma história que não é só de um dia, mas de um processo que durou dois anos, com o voto da Constituição de 1976 e as eleições a seguir. A ideia é mostrar que foi um processo com dificuldades, com ambiguidades, para encontrar o caminho para uma democracia ocidental, liberal. E também destacar o papel do povo, dos militares, dos partidos e de falar de tudo isto em 24 fotografias ", concluiu Yves Leonard.…
Neste programa Artes , vamos apresentar o projecto "Livro Zunga", da ONG Vitoria Luami em Angola. Uma iniciativa implementada por Baltazar Cateco, que trabalha para permitir que o maior número de pessoas tenha acesso à leitura. Foi na municipalidade de Cazenga, na província de Luanda, que tudo começou. Com o seu grupo de amigos, Baltazar Cateco organizou-se para concretizar os seus planos, sem imaginar um dia que a sua associação se tornaria uma organização não governamental reconhecida pelo Estado. Baltazar Cateco : "Nunca imaginei e nunca pensei em legalizar. Nunca pensei. Eu comecei no orfanato, um orfanato onde eu normalmente organizo eventos solidários. Eu sempre realizei eventos solidários com grupo de amigos. Para que chegasse a legalizar foi porque pediram-me. Alguém que gostava de também fazer parte e queria uma documentação que mostrasse que nós estávamos organizados oficialmente. Então, nunca pensei na legalização porque não me dedico 100% só nesta organização. Foi uma evolução que eu nunca pensei. Mas as coisas acontecem naturalmente, circunstancialmente. " Apaixonado pela leitura, Baltazar propõe acções solidárias em diversos locais da cidade, de forma a promover o acesso aos livros. "Nestes espaços eu posso colocar uma biblioteca e as pessoas aí vão procurar e consultar a minha biblioteca. Mesmo que eles não terminam de ler um livro, porque não estarei lá permanentemente, mas pelo menos vão ter noção do que é ver o livro X ou a capa do livro. E poderia, ao contrário, é procurar numa outra biblioteca. " Uma biblioteca itinerante que ocupa o espaço público e que dá acesso à colecção pessoal do Baltazar, sem uma temática específica, mas simplesmente e puramente pelo prazer da leitura e pela valorização da cultura literária angolana. "Sempre gostei de ler e adquirir muitos livros. Adquiri muitos livros. Normalmente não tenho ainda doações nem peço muitas solicitações de pessoas para me doarem livros, mas eu procuro mesmo os livros que tenho e que eu adquiri. Os livros são também de referência, até de estimação, são os meus livros de autores angolanos a autores estrangeiros são poucos. Deve haver muita, muita, muita literatura de crianças ." Além desta iniciativa, a associação também actua nos hospitais tentando alegrar de forma lúdica o quotidiano das crianças internadas, nomeadamente no Hospital Américo Boavida, na capital angolana, Luanda. "A iniciativa vem depois de uma festa que eu tinha dado no Américo Boavida. Foi uma sopa solidária que levávamos e notámos que tinha lá também crianças. Eu me apercebi que nos hospitais muitas crianças passam mais de um, dois anos e três não só internados, com uma grave doença psicológica que não lhe permite ainda sair do hospital e que eu já fiz referência anteriormente, que essa criança passa a usar o hospital como sua segunda casa. Então, como é essa necessidade? E como base também as pessoas que conversaram connosco dentro do hospital? Então eu levei a iniciativa de que a criança, tendo a sua segunda casa ou hospital, também precisam de brincar, sobretudo aquelas crianças que estão em fase de recuperação. " Para Baltazar Cateco a multiplicação dessas acções por todo o país é possível graças ao número de pessoas que trabalham para a ONG Vitória Lumi. Noutras províncias de Angola. "Neste momento, é apenas em Luanda, mais as pessoas que faziam parte da nossa organização, porque a nossa organização tem muitos voluntário, pois já estão fora de Luanda e trabalham lá como professores e também pela experiência que eles tiveram da nossa associação. O objectivo é a biblioteca móvel, mas também pretendo criar biblioteca fixa, mas nesse sentido, eu pretendo colaborar com a administração local. Eu identifico alguns espaços e solicito a administração para criar um centro, não só como biblioteca, mas também simultaneamente como Centro de recolha de donativos." Com esperança para o futuro, o criador do projecto Livro Zunga espera que a tecnologia possa permitir o acesso à leitura ao maior número de angolanos, sem se esquecer que o acesso aos tablets e smartphones ainda não é uma realidade para muitos habitantes de várias zonas de Angola. " Eu acho que sempre que se trata de uma evolução, é bem-vinda seleção e modernização. Então, se alguém tiver acesso à leitura por intermédio de um tablet, um telefone ou qualquer outro dispositivo eletrônico é sempre bem-vindo. Para os angolanos está muito bom. Só que muita gente não tem acesso ao telefone. Por isso a importância mesmo da livraria móvel." Através de bibliotecas itinerantes e iniciativas nos hospitais, Baltazar e a sua equipa trabalham para tornar a leitura acessível a todos, enriquecendo a vida das crianças e das comunidades. É o ponto final neste magazine que volta à antena já para a semana. Até breve !…
Neste programa, vamos conhecer Fredy Uamusse, um retratista moçambicano de 23 anos que sonha viver da sua arte. Além dos formatos tradicionais, Fredy Uamusse também desenha no chão, incluindo no pátio da sua própria casa. O pátio da casa de Fredy Uamusse tem sido tela para esboçar os rostos de várias personalidades, desde a figura incontornável da arte moçambicana Malangatana, a Cristiano Ronaldo que é para ele um ídolo no futebol e na forma intensa de trabalhar. O futebolista português " é uma figura internacional que inspira os jovens porque ele é determinado naquilo que faz ", explica Fredy. Quanto a Malangatana, " foi alguém que representou a cultura " e o jovem artista também tem como desejo " representar Moçambique a nível internacional ". O retratista também desenhou a humorista moçambicana Rebeca Cumbane e o músico moçambicano Twenty Fingers, entre outros. Fredy Uamusse frequenta o último ano do curso de artes plásticas no Instituto Superior de Artes e Cultura de Moçambique. Faz desenhos em papel, mas também desenha no chão. E é na sua casa, nos arredores de Maputo, que usa o chão para esboçar as suas figuras, com cinza, carvão, luz e sombra. Depois, publica as fotografias do resultado nas redes sociais, tendo quase 100.000 seguidores no Facebook. Trabalho no pátio de casa, debaixo de uma sombra, uma árvore de manga. Tenho de calcular o tempo da sombra, começar o desenho às nove e terminar até às onze para a sombra estar no desenho. Começo por enquadrar o pátio onde quero trabalhar, depois é tracejar com uma barra e seguir os contornos com o carvão. Em seguida, começo a trabalhar com luz e sombra, isto é, a trazer a diferenciação das areias vermelhas, brancas, amarelas, assim como o próprio carvão e a própria cinza. A cinza é para as partes brancas e que representam a luz. O artista conta, ainda, que, em criança, só tinha " um único lápis " quando começou a desenhar, por isso, em adulto, decidiu que a falta de material não o poderia limitar e que iria trabalhar com o que tivesse facilmente disponível. Fredy Uamusse sonha viver da sua arte e tem conseguido até agora, graças a muito trabalho e aos conselhos da avó para nunca desistir. Oiça a conversa neste ARTES.…
O Tarrafal assinalou no fim-de-semana passado o centenário do nascimento de Amílcar Cabral com o festival Pela Paz . "Com este festival queremos reforçar a referência do Tarrafal como um lugar de paz e símbolo de liberdade", conta-nos porta-voz do festival, Madair Feire. O curador do evento, músico, escritor e antigo ministro da cultura de Cabo Verde, Mário Lúcio Sousa, explica a sua relação com Amílcar Cabral, líder revolucionário e intelectual que lutou pela independência de Cabo Verde e da Guiné-Bissau. Uma inspiração na obra, literatura e música de Mário Lúcio. "Tenho uma relação espiritual com Cabral, em dimensões que nem eu entendo bem. Vejo-o com frequência e quando escrevi o romance sobre ele, tivemos vários diálogos. O livro apareceu por acaso, mas foi Amílcar Cabral que mudou a minha vida. Um dia encontrei um poema dele, recitava-o na rua e viram em mim uma criança um pouco precoce. Ajudaram-me a ter acesso a uma educação porque os meus pais eram pobres", conta. Cabral mudou a vida de "todos os cabo-verdianos, ao dar a sua própria vida em troca da liberdade e da independência, defendendo sempre uma filosofia sem ódio. A guerrilha foi necessária, sim, mas ele tinha uma noção de paz. Escreveu várias cartas ao governo português a pedir diálogo, mas nunca obteve resposta. E quando a repressão aumentou, os outros tiveram que se defender e ele continuou a defender a via da paz" , acrescentou. Mário Lúcio nasceu e vive no Tarrafal e fez questão que a primeira edição do festival Pela Paz decorresse nessa vila: "Costumam dizer que temos um coração de pescador porque os pescadores têm uma enorme paciência; deitam a linha na água e ficam ali horas e horas sem apanhar um peixe. Aqui encontramos uma paz natural". A cultura foi um dos pilares fundamentais no processo de libertação e desenvolvimento de Cabo Verde e da Guiné-Bissau. Amílcar Cabral acreditava que a cultura era um dos principais elementos de resistência contra o colonialismo, defendendo a ideia de que a preservação e valorização da identidade cultural de um povo eram essenciais para o sucesso da luta pela independência. "No Tarrafal tivemos a prisão e estiveram cá muitos prisioneiros. Conseguiram a liberdade com a luta de Amílcar Cabral e o Tarrafal tornou-se num símbolo de liberdade. Com este festival queremos reforçar a referência do Tarrafal como um local de paz e o símbolo da liberdade" , sublinha o porta-voz do festival, Madair Feire. A cantora cabo-verdiana, Mayra Andrade, subiu ao palco no sábado, 14 de Setembro. No final do concerto, contou-nos que a música é para ela a sua "forma de respirar, forma de ser" . "Como cabo-verdiana, acho que é muito claro para mim que a cultura alimenta a música cabo-verdiana. Ela é a nossa maior bandeira no mundo. Fazer parte desta constelação de artistas que levam o nome de Cabo Verde, alimenta em mim um sentimento de muita gratidão pela oportunidade que eu tenho de poder fazer disto a minha vida" , concluiu. O festival Pela Paz foi organizado por Mário Lúcio em parceria com a Câmara Municipal do Tarrafal, com objectivo de reforçar mensagem de paz através da arte e homenagear o centenário de Amílcar Cabral.…
Em França, arrancou esta quinta-feira a Semana do Design de Paris que conta com uma exposição dedicada ao design português. Chama-se “Made in Portugal naturally” e é uma vitrina da produção artística do sector. Neste programa, visitamos a exposição com a curadora e arquitecta de interiores Margarida Moura Simão. Há uma “casa portuguesa” na “Paris Design Week”, que arrancou a 5 de Setembro e decorre até 14 de Setembro. Nesta "casa", situada na Galerie Joseph, no bairro do Marais, há cerca de 60 peças que mostram o que é o design português de hoje, entre inovação e tradição, entre o clássico e o contemporâneo. O “showroom” chama-se “Made in Portugal naturally” e foi concebido como um apartamento, por onde se deambula entre as peças expostas. A curadora é a arquitecta de interiores Margarida Moura Simão, que nos fez uma visita guiada pelas diferentes salas e obras, desenhando um “ Portugal cosmopolita ” que produz “ um design autoral, irreverente e sofisticado ”, com um savoir-faire que alia tradição e tecnologia. Na conversa que pode ouvir neste programa, fomos tentar perceber o que é que têm de tão “ naturalmente ” português as peças de mobiliário, de iluminação, de têxtil e outros objectos decorativos ali em destaque. A minha vontade de enaltecer o que de melhor se faz em Portugal foi de utilizar este 'showroom' como um espaço doméstico. É muito fruto da minha experiência profissional, da forma como Portugal evoluiu e recebeu tantas pessoas estrangeiras e do olhar - não só estrangeiro mas também português - muito cosmopolita... Era mostrar que temos essa oferta de design no mercado, à altura de pessoas exigentes, que viajam, que têm referências multiculturais. Portugal tem esses produtos que reflectem essa cultura, essa qualidade no saber-fazer, na produção, nas referências culturais que tem. Entra-se, assim, numa “ casa portuguesa ” com produtos e design “ feitos em Portugal ”, em que o objectivo de Margarida Moura Simão é “ despertar curiosidade e surpresa no percurso da exposição ”. Logo no vestíbulo de entrada, a designer admite que se aposta num “ Portugal de luxo, irreverência, com cunho sofisticado e autoral ”, através de um banco de madeira curvado com longas almofadas prateadas, um tapete com diferentes tons de verde e efeito tridimensional ou um móvel lacado e misterioso da designer Luísa Peixoto. Na sala principal, a zona de refeições convida a sentar em torno de uma grande mesa de madeira do designer Vasco Fragoso Mendes, sob uma tapeçaria da Manufactura de Portalegre com o desenho “A Viagem” da artista plástica Emília Nadal, que aponta para outra tapeçaria, ao fundo. O tríptico colorido de “Janelas” tecidas abre um espaço de recepção, onde se destaca um “sofá confortável, sofisticado e intemporal”, vencedor de um prémio internacional de design em 2019, entre outras peças, como uma poltrona de formas redondas, um biombo de madeira e puffs de veludo. Há, ainda, um boudoir , ou seja, um espaço “ mais íntimo ”, decorado, por exemplo, com a tapeçaria “Cabo Verde do pintor Júlio Resende e com um banco chamado “Madonna”, dotado de pés de mármore e duas almofadas desencontradas e com padrões vibrantes. Na zona que sugere a casa de banho, há uma banheira em pedra com “ uma preocupação ecológica e sustentável ”, esculpida a partir de uma assemblage de peças de mármore, algo que “ é um material incontornável da cultura portuguesa ”, relembra Margarida Moura Simão. O showroom conta, também, com um quarto onde se destaca a roupa de cama a homenagear os bordados portugueses. No piso de cima, um escritório ecléctico combina o clássico de uma secretária com a irreverência da “Cadeira Alvor” do designer Daciano da Costa, uma peça icónica cor de laranja e com três pernas. Há, ainda, uma estante mais modular e industrial e uma “chaise longue” chamada “Lisboa” que ocupa o espaço “de uma forma mais diletante”, mostra-nos a arquitecta de interiores. Depois, para sugerir uma varanda e um espaço da evasão, Margarida Moura Simão escolheu um banco de design minimalista e multifuncional, inspirado da carpintaria japonesa, e um conjunto de tapeçarias a desenharem nuvens. No piso inferior, um sofá azul, cheio de volume, ladeia uma estante de azulejos de todas as formas, feitios e cores, em frente a um salão com exemplos de cadeiras dobráveis que são “ uma peça de design português incontornável ”. Do outro lado, uma vasta mesa expõe uma série de peças de cutelaria e cerâmica de refeição das mais variadas marcas portuguesas e há também espaço para uma máquina de café desenhada pelo francês Philippe Starck para uma empresa portuguesa. "Promover o design português" na "Paris Design Week" A Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP) organizou a iniciativa para promover o design português, nomeadamente a qualidade do produto e do material, a sustentabilidade e o “savoir-faire” português, como explicou Mariana Vieira da Luz, gestora da fileira casa na AICEP. O objectivo desta exposição é promover o design português e colocá-lo num patamar de relevância comparativo com grandes marcas e com a qualidade de outros grandes países nesta área do design de mobiliário, de iluminação, têxteis-lar e porque os nossos produtos têm muita qualidade. Nesta exposição temos cerca de 55 empresas e que foram todas escolhidas pela arquitecta Margarida Moura Simão e o que pretendemos promover é a qualidade do produto e do material que também é feito em Portugal, em conjunto com o design e a sustentabilidade. E daí vem o nome "Made in Portugal naturally" que faz justiça tanto à área da sustentabilidade que está muito em voga, mas também à parte do 'savoir-faire' português e da tradição. De 5 a 9 de Setembro, o Parque de Exposições de Villepinte, nos arredores de Paris, também acolhe a feira internacional de mobiliário e decoração Maison&Objet, na qual Portugal também participa.…
A
Artes
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A primeira longa metragem de Denise Fernandes valeu à realizadora cabo-verdiana o prémio de melhor cineasta emergente no Festival de cinema de Locarno que terminou a 17 de Agosto. "Hanami" tem como palco a Ilha do Fogo, no sotavento cabo-verdiano, onde Nana assiste à partida, mas também ao regresso de muitos habitantes do território, caso da sua mãe. A cineasta, nascida em Lisboa, crescida na Suíça de expressão italiana, volta a pegar em Cabo Verde, as suas raízes, para este novo filme, "Hanami", a sua primeira longa metragem. Ela começou por comentar à RFI qual a sua reacção com o galardão obtido na edição de 2024 do Festival de cinema de Locarno, na Suíça. Recebi a notícia por telefone alguns dias antes do festival terminar, mas disseram-me para não dizer mesmo a ninguém. E eu ainda estava com as actrizes do filme presentes em Locarno. Então, sabendo que eu não podia dizer a ninguém também, é quase como se não tivesse nenhuma reacção. E senti que o acontecimento se concretizou dois dias depois, quando foi possível fazer essa partilha de informação. E então, junto com as pessoas da equipa e com as actrizes, vivemos esse momento de felicidade que esperamos que vá dar alguma visibilidade ao filme em si. Então, já falou das actrizes. Poderíamos falar, por exemplo, de uma delas, que é a Sanaya Andrade. Como é que você escolheu este elenco? Foi um processo muito, muito longo. Eu comecei a viajar ao Fogo a partir de 2016 de forma regular, durante a escrita do filme. E em 2021, fiz uma primeira viagem com duas pessoas da equipa que foi uma área de "repérage" [reconhecimento] e nessa "repérage" conheci uma menina de cinco anos que afinal é a Nana, criança que aparece no filme, é a Daílma Mendes. E em 2023, quando o filme entrou quase em pré-produção, fizemos mesmo os "castings" oficiais do filme e confirmei a Daílma Mendes como Nana criança. E então a minha equipa, a directora do casting local e a minha assistente de realização foram mesmo visitar todas, todas, todas as escolas de toda a ilha para encontrar um "match" com a Nana, criança que de alguma forma já tinha escolhido. E a Sanaya foi uma dessas pessoas e afinal foi a pessoa que foi escolhida para o papel de Nana adolescente. Já referiu que de facto, a intriga ocorre nesta ilha do Sotavento cabo-verdiano, que é a Ilha do Fogo. É uma história de partidas, de regressos e daqueles que teimosamente ficam na ilha, não é? Sim, acho que essas dinâmicas são dinâmicas, que são a essência, acho de ser uma pessoa cabo verdiana. Mesmo que seja uma pessoa cabo-verdiana que vive na ilha ou uma pessoa da diáspora cabo-verdiana. Esses movimentos nos acompanham muito durante a nossa vida. Que seja uma pessoa que nos visita, uma pessoa que nunca conhecemos antes, um tio, uma prima, seja pessoas que ficam na ilha e que quando ligam por telefone sonham, quase idealizam o mundo fora. E depois há pessoas da diáspora que sonham de voltar e alguns voltam e alguns não voltam. Porque, de alguma forma, o Ocidente torna-se a nova casa. Então o filme fala também desses movimentos e dessas dinâmicas. Já referiu que foi um processo longo e ia-lhe perguntar como é que foi precisamente a escrita deste guião ? Eu sei que a senhora, embora tenha nascido na diáspora, precisamente no caso em Portugal e depois radicou-se na Suíça. A senhora a dada altura, ficava incomodada com a invisibilidade de Cabo Verde no mundo. Por ser um país pequenino, por ser um país arquipélagico que, muitas vezes, as pessoas nem sequer sabiam situar no mapa. Então fazia questão, de facto, em que a sua primeira longa metragem tivesse foco precisamente nesta terra, no Oceano Atlântico e, no caso, esta terra vulcânica !? Digamos que eu acho que a infância é o ponto de partida do trabalho de muitos artistas, e de forma consciente ou inconsciente. E eu lembro-me de criança na Suíça. Cresci na Suíça, naquela altura, nos anos 90 Cabo Verde era muito, muito desconhecido. E, na verdade, ainda hoje, viajando pela Europa, dependendo um pouco das culturas e dos países, é um país que não é conhecido e eu sempre a nível verbalmente, tenho sempre muito prazer em abrir o Google Maps e é mostrar às pessoas onde é e contar coisas sobre Cabo Verde. Mas lembro-me de, quando era pequena, confrontar-me com as reacções de quem não conhecia e também como ainda se utilizavam mapas e globos para ver o mundo. Lembro-me de que muitas vezes essas ilhas eram... Eu estava a ver o Oceano Atlântico à procura de Cabo Verde, porque Cabo Verde mesmo não estava presente ! Para mim é uma metáfora de uma pequena invisibilidade, mas que não só tem a ver com Cabo Verde. Acho que muitas ilhas do mundo pequeninas sofrem um bocadinho de um olhar que é um bocadinho imposto pelo turismo. Um olhar que muitas vezes vem de fora e não de dentro. E quando surgiu a vontade minha de fazer uma longa para mim, foi muito claro que ia ser filmada em Cabo Verde. Já agora, conviria que recapitulássemos um pouco da sua trajectória. Eu dizia que já tinha ligação ao Festival de Locarno porque já em 2011 teve lá uma curta metragem, depois "Pão sem Marmelada" e "Idillyum". Foram projectos feitos em Cuba, aquando dos seus estudos nessa ilha das Caraíbas. Mas houve, logo a seguir, um projecto precisamente já sobre Cabo Verde, que foi o "Nha Mila", foi em 2020. Quer-nos fazer um pouco o fio condutor da sua trajectória? Sim, tudo começou: comecei a filmar na Suíça porque é onde eu cresci e onde fiz a minha primeira formação. A Suíça de expressão italiana, não é? Daí o "Buona Notte", por exemplo ? Exactamente, eu sou da Suíça italiana. E então os meus primeiros trabalhos foram filmados na Suíça italiana. Depois eu estudei em Cuba, fiz mestrado em Cuba. Então os trabalhos seguintes foram feitos em Cuba. E depois, quando eu voltei à Suíça de Cuba, fiquei assim com uma espécie de "E agora?"... Então, na verdade é interessante porque existe uma espécie de "gap" [fosso] de sete anos entre o meu último trabalho de Cuba até 2020, que é a curta "Nha Milla", que foi filmada em Lisboa, e é sobre uma escala. Uma mulher que faz uma escala, uma mulher cabo-verdiana que faz uma escala em Lisboa. E ao chegar a Lisboa encontra outras cabo-verdianas. E, pronto, são trajectórias que acabam por se cruzar. Exactamente, de alguma forma, eu própria viajei com os meus filmes porque então, depois de ter estudado em Cuba, vivi noutros países, na Europa. Mas depois, em 2016, decidi mudar-me para Lisboa. E é também a cidade onde nasci... E alguns anos depois nasceu "Nha Mila". Então, na verdade, os meus filmes me conduziram de volta para Portugal, antes, e , depois, para Cabo Verde. E neste momento, então, reside em Portugal ou na Suíça, ou entre um e outro ? Agora, principalmente em Lisboa. E qual é o percurso que antevê para este filme? Imagino que se pense em estreias, nomeadamente em Cabo Verde. Sei obviamente, que há um festival de cinema importante, precisamente na Ilha do Fogo. Como é que a senhora se projecta em relação à vida deste filme? O filme... estamos a ter o grande privilégio de, depois do Festival de Locarno, vamos apresentar esse filme em outros festivais internacionais. Então, de alguma forma, Locarno é o ponto do início. E depois temos uma grande, grandíssima prioridade, que é também no próximo ano de apresentar o filme na Ilha do Fogo, em Cabo Verde. Ainda não sabemos muito bem em que altura. E, depois dessa estreia em Cabo Verde, acho que paralelamente, talvez ainda o percurso dos festivais poder fazer uma estreia nas salas. Mas como são coisas que mais ligadas à distribuição do filme, deixo um bocadinho à distribuição a palavra. O Som e Fúria, nomeadamente ! A produtora é "O Som e a Fúria". Perguntar-lhe-ia para esta trajectória e chegou-se à sua primeira longa metragem... E é sempre uma referência muito importante na vida de um cineasta: Quais foram as referências que foram importantes para si? Quais são os filmes de que gosta? Quais são os cineastas de que gosta? Eu estou a falar de África ou do mundo em que se revê o que teve peso para si para esboçar a sua carreira? Eu tenho muitas referências. As primeiras, as mais primordiais para mim, são. Tem a ver com a literatura, a literatura grega, os contos clássicos, que sejam os irmãos Grimm, La Fontaine, a mitologia. A arte do conto, para mim, desde criança, me fascinava, mesmo muito. Depois, na adolescência, mais uma vez, a literatura. Eu cresci também com muita literatura italiana e existem obras maravilhosas, Pinóquio e outras. Então, digamos, foi sempre uma pessoa que amou muito o "storytelling" ligado à literatura. E o cinema chegou depois. Os realizadores de que eu gosto muito são Kiarostami [iraniano], Kieslowski [polaco], a Alice Rohrwacher [italiana] e o Diop Mambéty. também. Acho que tenho mesmo referências muito, várias. E em África há assim, algum nome que lhe venha à cabeça ? Para mim o Diop Mambéty [senegalês]: gosto muito de dos seus filmes: o "Touki Bouki", "A Menina que ia à procura do Sol". Eu acho que os seus filmes são fortemente enraizados numa realidade e, ao mesmo tempo, têm uma grande parte de fantasia. Então, digamos que gosto mesmo muito do trabalho dele. Imagino que não seja fácil projectar-se para uma vida no cinema. Devem ser muitas dificuldades, muitas barreiras por ultrapassar. A senhora está determinada agora que já chegou uma longa metragem de facto, de apostar na sétima arte e, se calhar de fazer outros projectos sobre Cabo Verde ou outras latitudes ? O "Hanami" foi uma grandíssima parte da minha vida, mas é verdade que agora que o filme estreou, isto também me vai dar espaço para alguma coisa nova. A primeira longa é sempre para quem cria. É um objectivo muito grande. É um parto difícil !? E agora, para mim, o passo seguinte está tudo em aberto. Eu própria estou curiosa porque ainda não sei exactamente o que vai vir. O tempo o dirá ?! Sim.…
Eneida Marta é conhecida pelo seu estilo peculiar que busca casar nas suas músicas a modernidade com a ancestralidade dos povos guineenses. Dona de uma das mais belas vozes da música moderna guineense, Eneida Marta traz sempre nos seus trabalhos alguma reflexão sobre a difícil situação da maioria das crianças guineenses sem nunca descurar a canseira enfrentada pela mulher. Como a própria diz, na história moderna da Guiné-Bissau, há e houve sempre grandes mulheres que não podem ser esquecidas. Uma dessas mulheres é a Okinka Pampa, aquela que foi a única mulher a ser coroada rainha de um dos povos da Guiné-Bissau, o povo Bijagó, das ilhas do mesmo nome. "Okinka foi a rainha dos Bijagós. A rainha Okinka Pampa, como muitos sabem, sucedeu ao seu pai e foi encarregue de proteger os ancestrais da ilha e ser a guardiã das suas tradições. Numa época em que o colono português se preparava para ocupar o arquipélago dos Bijagós, como parte das suas reivindicações territoriais na África" , começa por recordar Eneida Marta. O reinado de Okinka Pampa ocorre entre 1910 e 1930, sucedendo ao pai, entretanto, falecido, mas foi tempo suficiente para enfrentar o colonialismo português, acabar com a escravatura nas ilhas Bijagós, pacificar aquele território, que estava devastado por guerras fratricidas e ainda fundar direitos da mulher que vigoram até os dias de hoje. Entre o povo Bijagó, caso único na sociedade guineense, a mulher é quem escolhe o homem com quem casar e se um dia não gostar mais desse casamento, simplesmente despede o marido. Eneida Marta explica que sempre quis homenagear os feitos de Okinka Pampa e através dela, todas as mulheres guineenses. Praticamente desde que começou a cantar de forma profissional nos finais dos anos 1990, que tinha em mente contar a história de Okinka Pampa, através da música. "O tema ou a música, como se preferir, de Okinka Pampa, foi criada sensivelmente há quase um ano em Londres e então, desde aí deu-se o trabalho. Começou-se o trabalho desde da fase embrionária que começou em Londres e depois foi toda essa gravação ao longo dos meses e culminou com a filmagem do videoclipe, que foi em Dezembro de 2023. Esse projeto, no fundo, está a ser preparado há sensivelmente quase um ano," esclarece a cantora. Agora que o projecto saiu da imaginação, Eneida Marta espera que a música e o videoclipe sejam apreciados nos quatro cantos do mundo. "Naturalmente, com essa bela homenagem feita a essa nossa rainha que foi tão importante para a Guiné-Bissau como para a África, é claro que eu quero atingir o mundo" , diz. Eneida Marta acredita ter trabalhado com os melhores realizadores de videoclipes no mercado português, daí o resultado que surpreendeu a própria. A ideia foi oferecer algo cinematográfico a quem assiste à música Okinka através do vídeo. "O objectivo de fazermos um vídeo quase cinematográfico é propositado, claro. A ambição é muito grande em dar a conhecer a nossa Okinka Pampa. Não passa daquilo que eu disse. O objectivo deste trabalho é atingir o mundo e dar a conhecer Okinka Pampa. Trabalhei com um dos melhores em Portugal, que é o Wilson, que é o videógrafo com quem trabalhei e o Índio Nunes também na produção do vídeo. É claro que tem que chegar ao mundo. A história de Okinka Pampa realmente é e merece ser um filme" , considera a artista. A história de Okinka Pampa é tão valiosa quanto desconhecida até entre os próprios guineenses. Eneida Marta entende que se devia aproveitar o mote lançado pela sua música de homenagem à rainha do povo Bijagó para contá-la através de um filme. "É claro que o historiador Quinca Pampa daria um grande filme, digno de prémios. Disso não tenho a mais pequena dúvida" , conclui Eneida Marta, cuja nova música pode ser encontrada nas várias plataformas das redes sociais.…
No último ano, a voz de Ashley Fortes tem ecoado em diferentes estações do metro de Paris, o “maior palco” da capital francesa, onde milhares de pessoas passam diariamente. Fomos conhecer a cantora com origens cabo-verdianas, que homenageia Cesária Évora e que conquistou a etiqueta “Musicien du Métro”. Estamos no “ maior palco ” de Paris, aquele por onde passam milhares de pessoas todos os dias. É nesta azáfama dos corredores do metro que ecoa a famosa “ saudade ” da “ diva dos pés descalços ”, cantada por uma jovem francesa, de 33 anos, com raízes cabo-verdianas. Ashley Fortes começou a cantar no metro de Paris há cerca de um ano e faz parte do grupo de 300 músicos (seleccionados entre cerca de 1.000) que conquistaram a etiqueta de “Musicien du Métro”. Uma vitrina internacional que também permite ganhar a vida e complementar o seu trabalho de professora de canto. “ Eu adoro cantar no metro. Ontem, uma mulher parou e ficou uma hora a ouvir-me e disse-me ‘Você foi o meu sol neste dia’. Ver estas pessoas faz com que eu saiba porque canto. O metro é uma maneira de atingir muitas pessoas e eu adoro ”, conta à RFI na estação de Saint-Lazare, durante a última semana dos Jogos Olímpicos de Paris. Os corredores do metro de Paris foram também os primeiros palcos do músico americano Ben Harper ou do cantor nigeriano Keziah Jones. Ashley Fortes sabe disso e espera que novas oportunidades nasçam desta aventura. Eu adoro porque tem gente de todo o mundo que passa. É outra dimensão. Eu canto para todo o mundo! Ashley Fortes participou, em 2017, no programa televisivo em França “Nouvelle Star” e chegou à meia-final. Actualmente, está a preparar o seu primeiro EP e, em Junho, lançou o mais recente single intitulado “A Toutes les Femmes”. Descubra a história de Ashley Fortes, as suas origens, as suas inspirações e os seus projectos neste programa ARTES de 14 de Agosto de 2024.…
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